Realização: Michel Gondry
Principais Actores: Jim Carrey, Kate Winslet, Gerry Robert Byrne, Elijah Wood, Thomas Jay Ryan, Mark Ruffalo, Jane Adams, David Cross, Kirsten Dunst, Tom Wilkinson
Crítica:
Thou art lost and gone forever,
Dreadful sorry, Clementine.
Ele e ela são um autêntico par de inadaptados. Sentem-se atraídos, apesar das suas personalidades disfuncionais e aparentemente incompatíveis. Ele é um sentimentalista tímido e introvertido. Ela é, segundo a própria, a vindictive little bitch, uma temperamental e inconstante personagem, que quer viver tudo ao máximo. Ele é Joel Barish. Ela é Clementine Kruczynski. Ele é Jim Carrey, ela é Kate Winslet: as performances são incríveis, inteiras, completamente inesquecíveis. Conheceram-se ambos num friorento e invernoso dia de praia, quebrando as suas solidões e apaixonando-se. Mas Clementine tem um feitio difícil, que varia consoante a sua excêntrica cor de cabelo. Rapidamente se cansa do carácter algo tranquilo e reservado de Joel e, secretamente, decide apagá-lo da memória, numa inovadora clínica da cidade, denominada - tão apropriadamente - Lacuna. Quando Joel se confronta com o facto, a dor e a revolta são tamanhas que se dirige à mesma clínica, decidido a eliminá-la também dos seus arquivos pessoais. Quis o destino, no entanto, que se voltassem a encontrar um dia. Montauk, ouve Joel no inconsciente. E reencontram-se. As afinidades são imediatas e envolvem-se novamente, como se fosse a primeira vez, sem nada saberem dos seus passados.
A forma como o genial Charlie Kaufman constrói e organiza o argumento é decisiva para o impacto que toda a história tem em nós, espectadores. O Despertar da Mente começa pelo fim. Joel acorda e dirige-se a Montauk. Encontra uma estranha: Clementine Kruczynski, de nome. Quase ao minuto dezassete, a acção é interrompida e iniciam-se, para nossa surpresa, os créditos, com caracteres que se desfazem, quais memórias, ao som de Everybody's Got To Learn Sometimes. Que início magnífico. Quando a acção é retomada, voltamos atrás no tempo. Ser-nos-á contada a história que antecedeu a irreversível decisão de Joel e todo o processo de apagamento, tanto no exterior (insolitamente festivo) como no fantasioso interior da sua mente.
Memória a memória, a câmera trémula e delicada de Michel Gondry brilha em toda a sua virtuosidade. Confundem-se os espaços, as linhas temporais, a lógica. Distorce-se o som, dessincroniza-se, aliás, a relação entre o som e a imagem, acentua-se o jogo de perspectivas, e a filmagem cede, tantas vezes, à desfocagem do segundo plano, habilitada por um meticuloso trabalho de iluminação (Ellen Kuras). Desintegra-se o real, caem carros, desaparecem elementos cenográficos por meio de subtis ou engenhosos efeitos especiais. O delírio criativo é total e verdadeiramente extraordinário, assim como a montagem de Valdís Óskarsdóttir, assim como a banda sonora de Jon Brion, colaborador habitual de P. T. Anderson (Embriagado de Amor, Magnolia) e assim como todas as canções que a completam.
Muitas são as cenas de uma concepção deslumbrante e imaculada, verdadeiramente memoráveis: Joel e Clementine no gelo, a contemplar constelações no frio, o banho no lava-loiça, uma cama na praia nevada, o nostálgico retorno à infância - nostálgico, aliás, como todo o filme. Não deixa de ser curioso, quiçá irónico, que uma comédia toda ela sobre o apagamento de memórias emane tamanho sentimento de nostalgia.
O Despertar da Mente alia perfeita e magistralmente a comédia e o drama. O final do processo de apagamento é, quanto a mim, profundamente trágico. Dá-se de trás para a frente, desde as memórias mais recentes às mais antigas... Porém, a certa altura, Joel apercebe-se do erro tremendo que é eliminar Clementine da sua memória. Joel ama-a. É por isso que empreende uma luta interior incomensurável para tentar inverter o processo: Joel e Clementine dão as mãos e tentam escapar por entre as recordações, eclipsando o sistema por várias vezes. Todavia, o processo é implacável e irreversível. Estão na casa da praia onde se conheceram e, perante o último adeus, a cruel despedida. O mar avança. Desfaz-se a casa em ruínas, poeticamente:
Há como que uma certa lucidez na profundidade do inconsciente, como se o amor e os sentimentos autênticos falassem mais alto. Será o método, afinal, falível? Ao longo do filme apercebemo-nos de que sim. Afinal, Mary (Kirsten Dunst) está apaixonada pelo Dr. Howard Mierzwiak (Tom Wilkinson) e já se havia submetido antes à criteriosa eliminação das lembranças.
Quando o puzzle se compõe na nossa cabeça, apercebemo-nos da tremenda e inevitável força do amor: Joel e Clementine voltaram a envolver-se. Estava escrito? Quem sabe.
De uma inteligência e sensibilidade extremas, O Despertar da Mente é, certamente, uma das melhores e mais originais comédias românticas de sempre, que jamais quererei apagar da memória. Um filme único!
Oh my darling, oh my darling,
Oh my darling, Clementine...
Oh my darling, Clementine...
A FORÇA DO AMOR
Thou art lost and gone forever,
Dreadful sorry, Clementine.
Ele e ela são um autêntico par de inadaptados. Sentem-se atraídos, apesar das suas personalidades disfuncionais e aparentemente incompatíveis. Ele é um sentimentalista tímido e introvertido. Ela é, segundo a própria, a vindictive little bitch, uma temperamental e inconstante personagem, que quer viver tudo ao máximo. Ele é Joel Barish. Ela é Clementine Kruczynski. Ele é Jim Carrey, ela é Kate Winslet: as performances são incríveis, inteiras, completamente inesquecíveis. Conheceram-se ambos num friorento e invernoso dia de praia, quebrando as suas solidões e apaixonando-se. Mas Clementine tem um feitio difícil, que varia consoante a sua excêntrica cor de cabelo. Rapidamente se cansa do carácter algo tranquilo e reservado de Joel e, secretamente, decide apagá-lo da memória, numa inovadora clínica da cidade, denominada - tão apropriadamente - Lacuna. Quando Joel se confronta com o facto, a dor e a revolta são tamanhas que se dirige à mesma clínica, decidido a eliminá-la também dos seus arquivos pessoais. Quis o destino, no entanto, que se voltassem a encontrar um dia. Montauk, ouve Joel no inconsciente. E reencontram-se. As afinidades são imediatas e envolvem-se novamente, como se fosse a primeira vez, sem nada saberem dos seus passados.
A forma como o genial Charlie Kaufman constrói e organiza o argumento é decisiva para o impacto que toda a história tem em nós, espectadores. O Despertar da Mente começa pelo fim. Joel acorda e dirige-se a Montauk. Encontra uma estranha: Clementine Kruczynski, de nome. Quase ao minuto dezassete, a acção é interrompida e iniciam-se, para nossa surpresa, os créditos, com caracteres que se desfazem, quais memórias, ao som de Everybody's Got To Learn Sometimes. Que início magnífico. Quando a acção é retomada, voltamos atrás no tempo. Ser-nos-á contada a história que antecedeu a irreversível decisão de Joel e todo o processo de apagamento, tanto no exterior (insolitamente festivo) como no fantasioso interior da sua mente.
Memória a memória, a câmera trémula e delicada de Michel Gondry brilha em toda a sua virtuosidade. Confundem-se os espaços, as linhas temporais, a lógica. Distorce-se o som, dessincroniza-se, aliás, a relação entre o som e a imagem, acentua-se o jogo de perspectivas, e a filmagem cede, tantas vezes, à desfocagem do segundo plano, habilitada por um meticuloso trabalho de iluminação (Ellen Kuras). Desintegra-se o real, caem carros, desaparecem elementos cenográficos por meio de subtis ou engenhosos efeitos especiais. O delírio criativo é total e verdadeiramente extraordinário, assim como a montagem de Valdís Óskarsdóttir, assim como a banda sonora de Jon Brion, colaborador habitual de P. T. Anderson (Embriagado de Amor, Magnolia) e assim como todas as canções que a completam.
Muitas são as cenas de uma concepção deslumbrante e imaculada, verdadeiramente memoráveis: Joel e Clementine no gelo, a contemplar constelações no frio, o banho no lava-loiça, uma cama na praia nevada, o nostálgico retorno à infância - nostálgico, aliás, como todo o filme. Não deixa de ser curioso, quiçá irónico, que uma comédia toda ela sobre o apagamento de memórias emane tamanho sentimento de nostalgia.
O Despertar da Mente alia perfeita e magistralmente a comédia e o drama. O final do processo de apagamento é, quanto a mim, profundamente trágico. Dá-se de trás para a frente, desde as memórias mais recentes às mais antigas... Porém, a certa altura, Joel apercebe-se do erro tremendo que é eliminar Clementine da sua memória. Joel ama-a. É por isso que empreende uma luta interior incomensurável para tentar inverter o processo: Joel e Clementine dão as mãos e tentam escapar por entre as recordações, eclipsando o sistema por várias vezes. Todavia, o processo é implacável e irreversível. Estão na casa da praia onde se conheceram e, perante o último adeus, a cruel despedida. O mar avança. Desfaz-se a casa em ruínas, poeticamente:
Clementine: Come back and make up a good-bye, at least. Let's pretend we had one... Bye Joel.
Joel: I love you...
Clementine: Meet me... in Montauk...
Joel: I love you...
Clementine: Meet me... in Montauk...
Há como que uma certa lucidez na profundidade do inconsciente, como se o amor e os sentimentos autênticos falassem mais alto. Será o método, afinal, falível? Ao longo do filme apercebemo-nos de que sim. Afinal, Mary (Kirsten Dunst) está apaixonada pelo Dr. Howard Mierzwiak (Tom Wilkinson) e já se havia submetido antes à criteriosa eliminação das lembranças.
Quando o puzzle se compõe na nossa cabeça, apercebemo-nos da tremenda e inevitável força do amor: Joel e Clementine voltaram a envolver-se. Estava escrito? Quem sabe.
De uma inteligência e sensibilidade extremas, O Despertar da Mente é, certamente, uma das melhores e mais originais comédias românticas de sempre, que jamais quererei apagar da memória. Um filme único!
Eis um filme do qual gostei bastante.
ResponderEliminarA junção Winslet-Carrey era inimaginável para mim, mas ao vê-los juntos, constatei que formaram um belo casal.
Bem merecida a indicação de Kate Winslet. Jim Carrey tem que melhorar um pouco para se equiparar à sua parceira de filme...
O roteiro é interessante, as imagens são belas. Aprovei totalmente.
Preciso revê-lo a fim de comentá-lo no LeC.
Ah, o título brasileiro - felizmente uma tradução literal - é bem melhor do que "O Despertar da Mente".
LUÍS: Eu apreciei imenso a prestação de Jim Carrey. Para mim o actor esteve à altura do desafio e superou-o. Ele é um grande actor.
ResponderEliminarQuanto ao título, tem razão e concordo absolutamente com você.
Cumps.
Roberto Simões
CINEROAD - A Estrada do Cinema
Belo filme. Excelente argumento do Kaufman, realização genial do Gondryu... um dos meus filmes favoritos e uma das melhores obras do última década. Fico à espera da tua review!
ResponderEliminarKaufman é um louco mesmo... Um ótimo filme.
ResponderEliminarGosto muito desse filme ... além da relação de risos de Winslet e de tristeza de Jim Carrey, mas melhor atuação dele ainda continua sendo de The Truman Show que está soberbo ao infinito.
ResponderEliminarUm grande abraço Roberto e tentarei ser mais presente por aqui. Um grande abraço!
Este filme é genial!
ResponderEliminarJim Carrey em grande mesmo e com uma prestaçãomemorável a somar aos "The Truman Show", "Man on the Moon" e "The Majestic". Até no "Number 23" ele fez um papelão jeitoso
A construção narrativa e as soluções visuais fazem dele uma obra de culto absoluto. Tem sido merecidamente bem tratado pela critica ao contrário de Jim Carrey que merecia mais reconhecimento como actor.
Fraquinho!
ResponderEliminarIndependentemente da grande interpretação de Carrey e do final magnífico, a faceta surrealista e algo confusa do filme impede-me de lhe atribuir uma nota acima de 4*.
ResponderEliminarAbraço
Eu gostei de uma forma geral. Actuações convincentes, fotografia e cenários em sintonia, argumento inteligente que foge ao comum e realização capaz e à altura.
ResponderEliminarPara ser sincero acho-o também um pouco confuso e dinâmico demais às vezes...de qualquer modo paradoxalmente também é isso que lhe dá o valor e a distinção hoje em dia. Acima de tudo um bom filme.
Surrealista??!!! Nunca viste filmes surrealistas pois não Brown?
ResponderEliminarAM,
ResponderEliminarNão, nunca vi. Nem um sequer...
Nada...
Embora deva reconhecer o meu erro: aquelas conversas e situações por entre as memórias de Joe eram do mais realista possível...
Ótimo filme, com interpretações grandiosas de Jim Carrey e Kate Winslet.
ResponderEliminarO título brasileiro é bem diferente, engraçado como esse título parece outro filme e não o Brilho eterno de uma mente sem lembrança.
Ótima atuação do jim carey, mostrando que sabe fazer algo além da comédia!
ResponderEliminarVim aqui para comentar e percebi que eu já havia comentado.
ResponderEliminarSó pra firmar minha opinião: creio que se trata de uma boa obra, com destaque especial para a atuação dos atores principais, que realmente estão entrosados. O roteiro me agradou e a direção eficiente de Michael Gondry merece elogios.
=)
É um filme espantoso. Gondry apresenta-nos uma obra singular sobre o poder da mente cerebral, espantoso!
ResponderEliminarAbraço
Cinema as my World
Para mim, um filme muito sobrevalorizado. Acho que o argumento está engraçado, sim, mas não vejo o porquê de eleva-lo ao pedestal que elevam.
ResponderEliminarEngraçado, simplesmente.
PEREIRA: Sim, subscrevo-te inteiramente. Um dos melhores filmes da década 2000. Lindo, lindo, lindo.
ResponderEliminarMATEUS SOUZA: Louco ou não, muito bom filme - sem dúvida!
DR JOHNNY STRANGELOVE: Hello ;) A de TRUMAN SHOW é muito boa, assim como a de HOMEM NA LUA, mas a minha preferida é mesmo esta!
ARM PAULO FERREIRA: Estou de acordo! Grande filme.
ÁLVARO MARTINS: Deves estar equivocado ;)
JACKIE BROWN: Impede-te porquê?
JORGE: Gosto bem mais do que tu. É um filme ufff... extraordinário. Um dos meus filmes preferidos.
AM: Não sendo um filme surrealista, tem o seu quê de surrealista. Gondry recupera o imaginário dos sonhos.
VITOR SILOS: De acordo ;) O vosso título é muito melhor, de facto.
VOLVER UM FILME: Claro que sim. Carrey é muito mais do que um actor cómico. Mas isso já é um dado adquirido.
LUES: Obrigado por mais um comentário. Estou de acordo, ainda que - aparentemente - mais entusiasmado.
NEKAS: Espantoso é um óptimo adjectivo! ;) Grande filme!
DIOGO F: Não concordo.
Cumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Excepcional! Por que o Jim Carrey não abandona de vez a comédia (como fez o Tom Hanks) e parte pra mais projetos como esse. Simplesmente lúdico.
ResponderEliminarCultura? O lugar é aqui:
http://culturaexmachina.blogspot.com
PSEUDO-AUTOR: Nunca me tinha ocorrido a comparação entre os dois actores; penso que se trata de casos diferentes, mas entendo a linha de raciocínio. Mais do que lúdico, não é. Excepcional? Inteiramente.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Claro que não estou equivocado ;) Por muito original que possa ser o argumento do filme, não posso dar valor a um producto comercial lamechas e ridículo. E Jim Carrey é Man on the Moon, é Truman Show e pouco mais.
ResponderEliminarÁLVARO MARTINS: Não estou de acordo. Nem comercial nem ridículo. E Jim Carrey tem uma actuação brilhante - a minha preferida dele.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Esta "coisa" só me pode merecer a pontuação mais baixa, a afamada bola negra do "Mau" ou "Péssimo", segundo o teu próprio critério. Foi dos tais que não consegui chegar ao fim, não sou masoquista a esse ponto.
ResponderEliminarE mais uma vez tenho de concordar com o Álvaro, quando ele diz que o Jim Carrey é "Man in the Moon", "Truman Show" e pouco mais. Ah, lembro-me agora, também gostei do "Majestic"
RATO: É a tua opinião, na qual não me revejo minimamente. Mal de mim desvalorizar tamanha obra.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - Há 2 Anos na Estrada do Cinema «