Jorge Teixeira, Comentador assíduo do CINEROAD
Alexandre, O Grande é uma película que em vez de recorrer a muitas e grandes batalhas como cenário para contar uma história, se serve delas (poucas) para relatar o significado de um mito, de uma personagem, visto por ela mesma ou pelos que a rodeiam, numa perspectiva interior. Pois na realidade, será, acima de tudo, visto pelo criador da obra aqui transposta. Nesse sentido, Oliver Stone aborda a película com o objectivo claro de expor a sua visão daquilo que foi um dos maiores personagens históricos da antiguidade. Serve-se para isso de um narrador, de Ptolomeu, algo cínico e afiado (Anthony Hopkins claramente dispensável enquanto actor), para contar a sua perspectiva pessoal da vida do herói macedónio. E é aqui que triunfa, pois não é um narrador deliberadamente absoluto e objectivo, mas sim um homem de idade (e um oficial jovem) que, influenciado pelas suas próprias experiências e ângulos pessoais, oferece uma alternativa para mostrar a complexidade da personalidade aqui tratada. Uma visão sincera e subjectiva e, possivelmente para além dos factos. Talvez demasiado negra, que reflecte excessivos defeitos e receios no herói, mas ao mesmo tempo muito realista e esforçada em retirar e descobrir um ser humano num titã. Desconstrói um mito, uma lenda, um herói num homem carregado de ambição e de sonhos impossíveis. Um homem às tantas entregue a poucas companhias. Compreendido só pelos seus próprios mitos. Amigo para alguns e venerado por outros tantos, será no entanto respeitado e admirado por todos.
Esta visão do realizador converte-se na espinha dorsal da vida do protagonista e do próprio filme, na tumultuosa relação com os seus pais e na aprendizagem inicial. Stone mostra com delicadeza como estes traumas na juventude determinam posteriormente o mundo de Alexandre. Demonstra essa preocupação na caracterização do personagem ao longo de toda a fita, sendo como realizador, inteligente e habilidoso com a câmara, como também atrevido e efectivo por vezes. A cena em que Alexandre cai ferido e toda a paleta se tinge de magenta é de uma extrema beleza tremendamente adequada. O resultado é uma cena soberba em todos os sentidos, sobretudo na fotografia. Aliás a fotografia, a cenografia, as coreografias, toda a direcção de arte e guarda-roupa estão deslumbrantes, roçando a perfeição. Quando juntas, constituem momentos inesquecíveis e muito bem filmados, como são exemplo as duas únicas batalhas do filme. Terrivelmente eficazes. Assim como a banda sonora que acompanha e eleva ao extremo as cenas, intemporalizando-as. Vangelis cria, pois, uma sonoridade única, linda, magnífica, muito bem entregue à história do não menos magnífico, Alexandre. Em relação à montagem e ao argumento é que a obra adquire alguns dos seus defeitos. Estes, que dizem respeito à estrutura narrativa, por vezes lenta em demasia, incoerente em determinadas transições, e sobretudo desequilibrada no seu conjunto. O narrador sendo essencial tem algumas incoerências também, relata passagens que deveriam estar sendo encenadas, enquanto fica ausente nos tais momentos mais cansativos. Por outro lado, nas interpretações tem-se um elenco de um modo geral credível e em sintonia, em que se destacam Angelina Jolie, com a sua força e carisma e Val Kilmer, com uma actuação conseguida e vivaça. Colin Farrel está muito bem, mas algo exagerado em determinadas cenas de grande carga emotiva, tornando menos credível o potente guião que interpreta. Decepcionante por vezes com essa energia desequilibrada, poderá dizer-se, mas no cômputo geral coerente, dedicado e à altura do desafio.
Em suma, um filme muito subvalorizado que não é o grande, o épico filme que poderia ter sido, mas que dá a impressão de não ser visto pela perspectiva mais adequada. A profundidade que Oliver Stone consegue obter no tratamento do protagonista é por demais incompreendida. Provavelmente influência da história do personagem, das possíveis alterações à vida conhecida do herói. Será, contudo, melhor visionar a película, não tanto como um documento histórico, mas como uma análise narrativa, poética e subjectiva de um homem reconhecido por todos pelas suas conquistas, mas afinal de contas também de carne e sangue como qualquer um de nós.
Especial destaque à edição mais recente intitulada Alexander Revisited: The Final Cut, que dispõe de cerca de 40 minutos extra e que se encontra profundamente alterada na montagem, melhorando o produto final. As cenas adicionais acentuam essencialmente as relações entre Alexandre e as suas constantes mais próximas. No entanto a novidade maior reside no modo de organização da película e o ritmo imposto na montagem, que confronta duas linhas narrativas. A principal acompanha um Alexandre adulto, rei e conquistador na Ásia. A outra, e num contexto secundário em analepse, conta a vida de um Alexandre jovem em convivência com seus pais, ainda na aprendizagem. A acção avança, mas sempre estruturada por estas duas narrativas, com paralelismos e articulações interessantes que sustentam melhor as decisões do argumento. Anthony Hopkins como Ptolomeu e narrador é o mediador desta complexa transição entre cenas, o que lhe dá maior dimensão e credibilidade, ainda que a sua aparência física fosse mais uma vez dispensável. Apesar de tudo algumas falhas, referidas anteriormente, mantêm-se tanto no argumento como na montagem.
Esta visão do realizador converte-se na espinha dorsal da vida do protagonista e do próprio filme, na tumultuosa relação com os seus pais e na aprendizagem inicial. Stone mostra com delicadeza como estes traumas na juventude determinam posteriormente o mundo de Alexandre. Demonstra essa preocupação na caracterização do personagem ao longo de toda a fita, sendo como realizador, inteligente e habilidoso com a câmara, como também atrevido e efectivo por vezes. A cena em que Alexandre cai ferido e toda a paleta se tinge de magenta é de uma extrema beleza tremendamente adequada. O resultado é uma cena soberba em todos os sentidos, sobretudo na fotografia. Aliás a fotografia, a cenografia, as coreografias, toda a direcção de arte e guarda-roupa estão deslumbrantes, roçando a perfeição. Quando juntas, constituem momentos inesquecíveis e muito bem filmados, como são exemplo as duas únicas batalhas do filme. Terrivelmente eficazes. Assim como a banda sonora que acompanha e eleva ao extremo as cenas, intemporalizando-as. Vangelis cria, pois, uma sonoridade única, linda, magnífica, muito bem entregue à história do não menos magnífico, Alexandre. Em relação à montagem e ao argumento é que a obra adquire alguns dos seus defeitos. Estes, que dizem respeito à estrutura narrativa, por vezes lenta em demasia, incoerente em determinadas transições, e sobretudo desequilibrada no seu conjunto. O narrador sendo essencial tem algumas incoerências também, relata passagens que deveriam estar sendo encenadas, enquanto fica ausente nos tais momentos mais cansativos. Por outro lado, nas interpretações tem-se um elenco de um modo geral credível e em sintonia, em que se destacam Angelina Jolie, com a sua força e carisma e Val Kilmer, com uma actuação conseguida e vivaça. Colin Farrel está muito bem, mas algo exagerado em determinadas cenas de grande carga emotiva, tornando menos credível o potente guião que interpreta. Decepcionante por vezes com essa energia desequilibrada, poderá dizer-se, mas no cômputo geral coerente, dedicado e à altura do desafio.
Em suma, um filme muito subvalorizado que não é o grande, o épico filme que poderia ter sido, mas que dá a impressão de não ser visto pela perspectiva mais adequada. A profundidade que Oliver Stone consegue obter no tratamento do protagonista é por demais incompreendida. Provavelmente influência da história do personagem, das possíveis alterações à vida conhecida do herói. Será, contudo, melhor visionar a película, não tanto como um documento histórico, mas como uma análise narrativa, poética e subjectiva de um homem reconhecido por todos pelas suas conquistas, mas afinal de contas também de carne e sangue como qualquer um de nós.
Especial destaque à edição mais recente intitulada Alexander Revisited: The Final Cut, que dispõe de cerca de 40 minutos extra e que se encontra profundamente alterada na montagem, melhorando o produto final. As cenas adicionais acentuam essencialmente as relações entre Alexandre e as suas constantes mais próximas. No entanto a novidade maior reside no modo de organização da película e o ritmo imposto na montagem, que confronta duas linhas narrativas. A principal acompanha um Alexandre adulto, rei e conquistador na Ásia. A outra, e num contexto secundário em analepse, conta a vida de um Alexandre jovem em convivência com seus pais, ainda na aprendizagem. A acção avança, mas sempre estruturada por estas duas narrativas, com paralelismos e articulações interessantes que sustentam melhor as decisões do argumento. Anthony Hopkins como Ptolomeu e narrador é o mediador desta complexa transição entre cenas, o que lhe dá maior dimensão e credibilidade, ainda que a sua aparência física fosse mais uma vez dispensável. Apesar de tudo algumas falhas, referidas anteriormente, mantêm-se tanto no argumento como na montagem.
Muito agradecido pelo convite.
ResponderEliminarÁs vezes penso, este filme devia ter mesmo mais reconhecimento, porque me parece que se destrói por completo um projecto e um produto apenas pela estrutura narrativa e algumas opções no argumento (sendo importantes claro). E a ver bem aqui há uma aproximação aos clássicos da década de 50 e 60 mais evidente do que na maioria dos épicos ressuscitados a partir dos anos 90.
Existe menos batalhas e acção desenfreada, é um pouco por aí.
abraço
JORGE: Devia ter mais reconhecimento, pois. É um filme muito subvalorizado.
ResponderEliminarEu é que agradeço o convite, escreveste um bom texto sobre esta obra apaixonante ;)
Cumps.
Roberto Simões
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