★★★★★
Título Original: Иваново детство / Ivanovo DetstvoRealização: Andrei Tarkovsky
Principais Actores: Nikolai Burlyayev, Valentin Zubkov, Yevgeni Zharikov, Stepan, Krylov, Nikolai Grinko, Dmitri Milyutenko, Valentina Malayavina
Crítica:
AS RUÍNAS DA INOCÊNCIA
Imaculado. Puro. Belíssimo. Assim é o cinema de Andrei Tarkovsky e assim é A Infância de Ivan. Os toques poéticos do autor, extremamente sensíveis e virtuosos, reflectem-se em toda e cada uma das cenas e imagens da obra: nas árvores brancas e nos riachos cintilantes de uma natureza condenada pela guerra dos homens... nas chamas cadentes e na infância perdida de um tempo corrompido e cruel onde secou a esperança e onde só há espaço para a tragédia e para o desgosto... no sonho, refúgio de memórias, onde um sorriso abraça e reconforta o coração de uma criança inocente, escapando às agruras do real e aos horrores da loucura humana.
Emocionalmente arrebatadora e - eu diria mesmo - desoladora, a primeira longa-metragem do génio e visionário russo conta-nos a história de Ivan, um corajoso e destemido loirinho magricelas de pele e osso, um menino feito órfão pelas atrocidades da 2ª Guerra Mundial e apadrinhado pelo exército da União como espião, e que vive cada instante como se fosse um adulto, como se fosse um soldado da frente soviética e um elemento não só útil como preponderante na estratégia bélica. A morte da mãe e da família abandonou-o à mais completa solidão e é esse o factor que motiva a sua atitude beligerante e a sua tenacidade em resistir com empenho às dificuldades do momento. Ivan, de doze anos, parece ser o único a acreditar que todo aquele pesadelo de sangue e morte vai acabar. Veja-se a metáfora do velho do quadro, que afirma que nada vale a pena. Ivan continuará a sua missão até ao fim, sem cessar: só descansa em tempo de guerra quem não presta, riposta imediatamente, quando um dos soldados lhe diz que deveria descansar e estudar.
Ao mesmo tempo que reproduz com assaz e profundo realismo o drama e as penosas consequências do confronto (e em especial o impacto psicológico do poder destrutivo da guerra para uma criança), A Infância de Ivan aventura-se, com uma destreza e criatividade incríveis, pelo surrealismo, pelo maravilhoso e pelo fantástico do universo onírico. A transição entre as duas dimensões supera-se eximiamente e na façanha reside uma das qualidades mais admiráveis da obra: aquela cena em que o pequeno Ivan (atravessado o pântano, o frio, a fome e as balas) adormece sobre os cuidados do tenente Galtsev (Yevgeni Zharikov) e liricamente se ascende (tanto pelo som como pela arte de filmar) pelo poço de recordações ao reconforto de um passado precioso... é absolutamente extraordinária. Uma outra cena reside entre as mais memoráveis da obra: as trincheiras rasgam a terra e as oportunidades para encontrar o amor escasseiam. Aquele beijo inesperado em que o capitão Kholin (Valentin Zubkov) envolve a enfermeira Masha (Valentina Malyavina), deixando-a em suspenso sobre a valeta, é de uma beleza indiscritível e de uma carga simbólica notável.
O preto e branco de Vadim Yusov, no máximo da perfeição, eleva e sublima as potencialidades da fotografia, permitindo-nos a nós, espectadores, respirar a paisagem. A banda sonora de Vyacheslav Ovchinnikov enebria-nos com a sua emoção e subtileza, a montagem de Lyudmila Feiginova flui cuidada e irrepreensível. No seu todo, A Infância de Ivan apresenta-se como um todo brilhante, capaz de nos confrontar com as mais pertinentes reflexões filosóficas.
Um clássico obrigatório é dizer pouco: obra-prima absoluta!
Emocionalmente arrebatadora e - eu diria mesmo - desoladora, a primeira longa-metragem do génio e visionário russo conta-nos a história de Ivan, um corajoso e destemido loirinho magricelas de pele e osso, um menino feito órfão pelas atrocidades da 2ª Guerra Mundial e apadrinhado pelo exército da União como espião, e que vive cada instante como se fosse um adulto, como se fosse um soldado da frente soviética e um elemento não só útil como preponderante na estratégia bélica. A morte da mãe e da família abandonou-o à mais completa solidão e é esse o factor que motiva a sua atitude beligerante e a sua tenacidade em resistir com empenho às dificuldades do momento. Ivan, de doze anos, parece ser o único a acreditar que todo aquele pesadelo de sangue e morte vai acabar. Veja-se a metáfora do velho do quadro, que afirma que nada vale a pena. Ivan continuará a sua missão até ao fim, sem cessar: só descansa em tempo de guerra quem não presta, riposta imediatamente, quando um dos soldados lhe diz que deveria descansar e estudar.
Ao mesmo tempo que reproduz com assaz e profundo realismo o drama e as penosas consequências do confronto (e em especial o impacto psicológico do poder destrutivo da guerra para uma criança), A Infância de Ivan aventura-se, com uma destreza e criatividade incríveis, pelo surrealismo, pelo maravilhoso e pelo fantástico do universo onírico. A transição entre as duas dimensões supera-se eximiamente e na façanha reside uma das qualidades mais admiráveis da obra: aquela cena em que o pequeno Ivan (atravessado o pântano, o frio, a fome e as balas) adormece sobre os cuidados do tenente Galtsev (Yevgeni Zharikov) e liricamente se ascende (tanto pelo som como pela arte de filmar) pelo poço de recordações ao reconforto de um passado precioso... é absolutamente extraordinária. Uma outra cena reside entre as mais memoráveis da obra: as trincheiras rasgam a terra e as oportunidades para encontrar o amor escasseiam. Aquele beijo inesperado em que o capitão Kholin (Valentin Zubkov) envolve a enfermeira Masha (Valentina Malyavina), deixando-a em suspenso sobre a valeta, é de uma beleza indiscritível e de uma carga simbólica notável.
O preto e branco de Vadim Yusov, no máximo da perfeição, eleva e sublima as potencialidades da fotografia, permitindo-nos a nós, espectadores, respirar a paisagem. A banda sonora de Vyacheslav Ovchinnikov enebria-nos com a sua emoção e subtileza, a montagem de Lyudmila Feiginova flui cuidada e irrepreensível. No seu todo, A Infância de Ivan apresenta-se como um todo brilhante, capaz de nos confrontar com as mais pertinentes reflexões filosóficas.
Um clássico obrigatório é dizer pouco: obra-prima absoluta!
Penso eu que posso apelidar de obra-prima!
ResponderEliminarA cena da praia é de um primor inexplicável.
Abraço
Cinema as my World
Ai se não deres excelente dou-te um tiro :D
ResponderEliminarJá vais começar a subir uns pontos na minha consideração ;) agora sim vais começar a ver cinema a sério :p
ResponderEliminarNEKAS: Sim, creio que sim. Eu pelo menos afirmo aos sete ventos ;) Obra-prima belíssima!
ResponderEliminarFLÁVIO GONÇALVES: Mesmo que falhasses o disparo, não seria necessário passares à acção: adivinhaste ;)
ÁLVARO MARTINS: Só agora? ;) Isso é que são graves problemas de vista, não? ;) Grande filme, grande realizador, sim senhor.
Cumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
O melhor de sempre Roberto, mestre dos mestres dos génios ;)
ResponderEliminarQuanto aos problemas da vista tu lá sabes eheh ;)
Grande filme, e grande experiência. Durante a película é constante a sensação de transcendência ou de intemporalidade. A fotografia deslumbra-me, tal como a banda sonora ou a realização, sobretudo esta - inventiva, artística, sempre à procura de novo. Depois o argumento é filosófico, reflexivo e ultra-emocional...lá mais para o fim é arrebatador.
ResponderEliminarEm suma gostei imenso, o meu primeiro contacto com Tarkovsky foi qualquer coisa de muito especial.
abraço
JORGE: Quase toda a obra do realizador atinge, na minha opinião, essa transcendência. Considero SOLARIS ou ANDREI RUBLIOV filmes muito bons, mas não ao nível deste IVAN ou de STALKER ou O ESPELHO, os meus dois preferidos dele. Ainda me falta ver o NOSTALGIA e O SACRIFÍCIO, mas conto vê-los assim que possível. Este IVAN é mesmo uma obra magistral.
ResponderEliminarRoberto Simões
CINEROAD