★★★★
Título Original: A Outra Margem
Realização: Luís Filipe Rocha
Principais Actores: Filipe Duarte, Tomás Almeida, Maria D'Aires, Horácio Manuel, Sara Graça, Eduardo Silva, João Pedro Vaz
SER DIFERENTE
O fogo liberta os que partem
e aquece os que ficam.
e aquece os que ficam.
Há mágoas e ressentimentos que só têm uma razão para existirem: o preconceito; esse juízo discriminatório que tantas vezes nos afasta, não reconhecendo - essencialmente - os nossos verdadeiros sentimentos, e tendo por base - sobretudo - aquilo que os outros não aceitam e se recusam a aceitar, como se tivessem que aceitar. O que é mais vergonhoso? Cair nas bocas dos outros e sofrer com isso, por uns tempos, ou renegarmo-nos a nós próprios e àqueles que mais amamos, quiçá para sempre? O tempo traz a resposta e a solidão. Do mesmo modo, dói muito não ser aceite por aquilo que somos, por aqueles que mais amamos. Vidas seguem cursos separados, com grande angústia e sofrimento, desnecessariamente. É incrível e paradoxal entender como um pai ou uma mãe pode reclamar a sua felicidade, cobrando a infelicidade de um filho. Afinal, que pais somos?
Nascer concretiza, muitas vezes, o primeiro estágio de aceitação. É certo que muitos bebés nascem com tudo no sítio, aparentemente saudáveis e ignorando o futuro de diferença que os espera. É o caso de Ricardo (magistral interpretação de Filipe Duarte), cujo assumir da sua identidade, leia-se homossexualidade, o condena para sempre ao afastamento da família, desmoronando assim um pilar fundamental para a sua edificação pessoal. Adeus, Pai. Adeus, Mãe. Porém, veja-se o caso do seu sobrinho Vasco (Tomás Almeida, radioso), que ao nascer com trissomia 21 acaba de vez com as expectativas dos pais. E não é aceite, por isso? É, pois. Pode levar um tempo, pode alterar a vida de uma família inteira, mas é aceite. A diferença é aceite e integrada. Com alguma dificuldade, mas na maior parte das vezes a dificuldade está apenas nas nossas cabeças. Agora a questão: vale a pena, um filho com síndrome de Down? Teria valido a pena, antes, abortá-lo? Veja-se Vasco: é feliz, tem esperança, acredita, é o coração pulsante de toda aquela família. Eu vou casar! É mais feliz do que qualquer outro. É o tesouro da mãe Maria (Maria D'Aires, sublime) e a alegria de José, o avô. Agora veja-se Ricardo, o menino que nasceu são: é feliz?...
De quem é a culpa? Das expectativas?...
Há destinos que ficarão irremediavelmente separados, cada um na sua margem do rio, enquanto não houver uma ponte para o perdão e para a aceitação. Note-se o regresso de Ricardo a Amarante, depois da tão traumática morte do namorado... O simbolismo daquela cena em que revisita o pai, enfrentando o passado e passados tantos anos, é fortíssimo... O filme pode ser lento e contido, mas as emoções transbordam, por vezes. E como transbordam! E o limiar para que isso aconteça é tão ténue. Veja-se como a alegria e o amor à vida de Vasco é contagiante, mesmo para o tio que tentou o suicídio, tal era a agonia, o sufoco e a dor da perda. Veja-se como os dois - ambos diferentes, cada um à sua maneira - se aceitam mutuamente, sem qualquer tipo de preconceito... veja-se como eles têm afinidades e realidades comuns. Veja-se a cena em que os dois saem à noite e vão dançar para a discoteca: os dois, o mongolóide e o paneleiro traveca. Veja-se como os dois se divertem, alheios ao olhar condenatório. Veja-se como o plano seguinte repete o carro, com o som pulsante da música, e o horror nos assola a mente com o receio imediato do preconceito; louros para Luís Filipe Rocha.
Nascer concretiza, muitas vezes, o primeiro estágio de aceitação. É certo que muitos bebés nascem com tudo no sítio, aparentemente saudáveis e ignorando o futuro de diferença que os espera. É o caso de Ricardo (magistral interpretação de Filipe Duarte), cujo assumir da sua identidade, leia-se homossexualidade, o condena para sempre ao afastamento da família, desmoronando assim um pilar fundamental para a sua edificação pessoal. Adeus, Pai. Adeus, Mãe. Porém, veja-se o caso do seu sobrinho Vasco (Tomás Almeida, radioso), que ao nascer com trissomia 21 acaba de vez com as expectativas dos pais. E não é aceite, por isso? É, pois. Pode levar um tempo, pode alterar a vida de uma família inteira, mas é aceite. A diferença é aceite e integrada. Com alguma dificuldade, mas na maior parte das vezes a dificuldade está apenas nas nossas cabeças. Agora a questão: vale a pena, um filho com síndrome de Down? Teria valido a pena, antes, abortá-lo? Veja-se Vasco: é feliz, tem esperança, acredita, é o coração pulsante de toda aquela família. Eu vou casar! É mais feliz do que qualquer outro. É o tesouro da mãe Maria (Maria D'Aires, sublime) e a alegria de José, o avô. Agora veja-se Ricardo, o menino que nasceu são: é feliz?...
De quem é a culpa? Das expectativas?...
Há destinos que ficarão irremediavelmente separados, cada um na sua margem do rio, enquanto não houver uma ponte para o perdão e para a aceitação. Note-se o regresso de Ricardo a Amarante, depois da tão traumática morte do namorado... O simbolismo daquela cena em que revisita o pai, enfrentando o passado e passados tantos anos, é fortíssimo... O filme pode ser lento e contido, mas as emoções transbordam, por vezes. E como transbordam! E o limiar para que isso aconteça é tão ténue. Veja-se como a alegria e o amor à vida de Vasco é contagiante, mesmo para o tio que tentou o suicídio, tal era a agonia, o sufoco e a dor da perda. Veja-se como os dois - ambos diferentes, cada um à sua maneira - se aceitam mutuamente, sem qualquer tipo de preconceito... veja-se como eles têm afinidades e realidades comuns. Veja-se a cena em que os dois saem à noite e vão dançar para a discoteca: os dois, o mongolóide e o paneleiro traveca. Veja-se como os dois se divertem, alheios ao olhar condenatório. Veja-se como o plano seguinte repete o carro, com o som pulsante da música, e o horror nos assola a mente com o receio imediato do preconceito; louros para Luís Filipe Rocha.
Enfim, A Outra Margem pode ser um objecto cinematográfico com algumas limitações, nomeadamente ao nível do argumento e ao nível da própria narrativa da filmagem. Porém, é um filme com méritos e vários. A começar pelos desempenhos. Depois, a iluminação e a fotografia: o trabalho de Edgar Moura é verdadeiramente determinante - tanto para a atmosfera dramática que percorre todo o filme como para a beleza que tão bem o caracteriza. A banda sonora original de Pedro Teixeira da Silva, d'Os Corvos, é tocante, envolvente... e tão bela, à altura da sensibilidade que o projecto exigia.
No culminar do meu juízo: agradável descoberta. Pela história, recomendadíssimo a todos, em especial aos pais. Não percam tempo.
No culminar do meu juízo: agradável descoberta. Pela história, recomendadíssimo a todos, em especial aos pais. Não percam tempo.
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