segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A CAMINHO DE IDAHO (1991)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
Título Original: My Own Private Idaho
Realização: Gus Van Sant
Principais Actores: River Phoenix, Keanu Reeves, William Richert, James Russo, Flea, Grace Zabriskie, Udo Kier, Rodney Harvey, Chiara Caselli, Michael Parker, Jessie Thomas, Sally Curtice

Crítica:

I'm a connoisseur of roads.
I've been tasting roads my whole life.

A ESTRADA
This road will never end.
It probably goes all around the world.

A Caminho de Idaho, visionária pérola de Gus Van Sant, situa-se algures entre a Perfeição e a Imperfeição. Tal como a vida de todos nós. Formalmente, é de difícil classificação: é um road movie (o seu tema é a estrada) com claras influências do western (a paisagem, a fogueira, as pistolas), é uma constante encenação de Shakespeare pelas ruas de Portland, embebida em melancolia, e, ao mesmo tempo, uma excepcional experiência avant-garde. A obra explora também a ambivalência sexual, mas o tratamento do amor universal é, porventura, um dos maiores feitos. Mike ama Scott e o que temos é um amor não correspondido entre duas pessoas, independentemente dos seus sexos. A dada altura, tanto Mike como Scott seguem o seu caminho, tomando as suas escolhas... e é interessante perceber como Gus Van Sant jamais se mostra tendencioso ou moralista; o sua arte fala por si só e de que maneira.

Viver passa por um inevitável ritual de auto-descoberta, por meio do qual encontramos o nosso lugar no mundo. À partida, esse caminho é mais fácil quando conhecemos e compreendemos o nosso passado, as nossas origens: esse factor dá-nos a estabilidade emocional essencial para a formação das nossas personalidade e identidade. Porém, os jovens de Gus Van Sant provêm de famílias disfuncionais, por algum motivo destruídas, e vêem-se sozinhos na estrada - sem saber ao certo de onde vêm e para onde vão. Estão desorientados, perdidos, alienados e... indefinidos. Mike, por exemplo, tenta reencontrar o amor da mãe (e reencontrar, desse modo, as suas origens) e encontrar o amor por alguém no seu dia-a-dia; quiçá por Scott, o seu melhor amigo:

Mike: We're good friends, and that's good to be, you know, good friends. That's a good thing. (...) That's okay. We're going to be friends.
Scott: I only have sex with a guy for money.
Mike: Yeah, I know, I mean...
Scott: And two guys can't love each other.
Mike: Yeah. Well, I-I don't know, I mean, I mean for me, I could love someone even if I, you know, wasn't paid for it. I love you, and... you don't pay me. (...) I really wanna kiss you, man. [pausa] Well goodnight man. [pausa] I love you, though. [pausa] You know that. I do love you.

As performances são absolutamente excepcionais. Os ritmos da narcolepsia de Mike marcam, tantas vezes, a própria cadência do filme... River Phoenix entrega-se de corpo e alma ao papel da sua (infelizmente curta) vida e mostra-se totalmente entrosado na personagem. Emana fascínio e inspiração... Brilhante! William Richert tem um desempenho formidável e Keanu Reeves, cujo talento raramente aprecio, revela-se assaz competente.

Tecnicamente, estamos perante um filme arrojado e irrepreensível. Os time-lapses marcam imediatamente o tom e o ambiente poético, assim como as muitas outras passagens líricas, sempre magnificamente fotografadas por John Campbell e Eric A. Edwards e extraordinariamente montadas por Curtiss Clayton. O orgasmo de Mike, por exemplo, é de nos deixar abismados e sem palavras; tal é a beleza, o simbolismo e a carga emocional daquele único e tão curto take. Então e a forma como Gus filma o sexo? Montagem rápida, planos estáticos mas em tempo real e com grande poder sugestivo. A confluência estética da obra não se fica por aqui: notem-se os diferentes tipos de filmagem, por exemplo, nas memórias de Mike. Ou a cena das capas de revista na loja de pornografia. Ou as entrevistas tipo-documentário a prostitutos reais, incorporadas no filme como se da diegese ficcional fizessem parte. A banda sonora é igualmente eclética e confunde-se perfeitamente com a natureza criativa da obra. Enfim, um todo completamente fascinante.

Sem dúvida: um dos melhores filmes dos anos 90 e um dos melhores filmes de Gus Van Sant. Uma sublime e obrigatória obra de arte.

Have a nice day.

3 comentários:

  1. No plano argumentativo, este filme de Gus van Sant é dos melhores e dos mais genuínos e nota-se, mais sentidos. No plano técnico é genial, cheio de metáforas, de belíssimos planos. É um filme muito poético.

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  2. TIAGO RAMOS: Completamente de acordo. Genuíno, fabuloso, poético e belíssimo.

    JACKSON: A cada dia que passa sem o veres, nem sabes o que perdes!

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema

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