★★★★★
Título Original: Se7enRealização: David Fincher
Principais Actores: Brad Pitt, Morgan Freeman, Gwyneth Paltrow, John C. McGinley, Richard Roundtree, Kevin Spacey
Crítica:
GULA.
LUXÚRIA. GANÂNCIA.
Sete Pecados Mortais é, todo ele, um filme sobre a cidade, a cidade como inferno, e sobre a apatia que dela emana e que afecta, de forma corrosiva e silenciosa, as sociedades modernas ocidentais. E depois, é claro, sobre uma das consequências dessa apatia levada ao extremo: a psicopatia de um John Doe, que se sente inspirado por Deus e que faz dos crimes calculados a sua obra-prima, como se por meio deles purificasse a humanidade e inspirasse o mundo.
Não é por acaso, note-se, que a maior banda sonora do filme é a banda sonora das cidades: um ruído ensurdecedor que invade cada cena, criando uma atmosfera tensa, agonizante e inevitavelmente poluída. A fotografia vive de um trabalho de iluminação portentoso, que se vê realçado pelo ambiente nocturno, negro e sombrio do meio urbano. As próprias personagens não se sentem bem na cidade, perdem-se na sua violência e infelicidade, caos e indefinição e procuram um escape, uma fuga possível. O detective William Somerset (Morgan Freeman, numa interpretação impecável), anseia por retirar-se do activo, procurando uma paz fora da cidade. Diz ele:
Quando entra num táxi, aliás, e lhe é perguntado para onde vai, rapidamente responde: far away from here. E quando Tracy Mills (Gwyneth Paltrow), também ela desgostosa com a mudança para a cidade, lhe pergunta how long have you lived here?, naquele amontoado de prédios e de almas perdidas, a resposta é imediata: too long. Quando à noite se deita, para finalmente descansar, põe o metrónomo no seu tic-tac, como se fosse possível marcar o ritmo da confusão. Como se fosse possível converter o tumulto infindável numa apaziguante ária de Bach. A desordem está, todavia, instalada.
John Doe marca, afinal, o novo crime: metódico e estudado, paciente e implacável. Os seus crimes são sermões e a sua resolução policial ganha contornos de quebra-cabeças.
E o crime baterá à porta de David Mills (Brad Pitt), inesperado, cruel e devastador, como poderá bater às portas de qualquer um de nós. E é esse factor que é tão assustador. Porque nos é, cada vez mais, tão próximo.
O argumento é subtil e detém passagens verdadeiramente memoráveis. Os desempenhos revelam genuína solidez, em especial o de Kevin Spacey como John Doe, que é perturbador e perfeitamente conseguido. Magnificamente realizado por David Fincher, o filme é um exercício de grande equilíbrio, subtileza e contenção. O final, então, é soberbo. Profundo. Magistral.
Sete Pecados Mortais é, pois, um marco incontornável do cinema policial, onde o suspense... ascende a um estado puramente sublime.
GULA.
LUXÚRIA. GANÂNCIA.
PREGUIÇA. VAIDADE. INVEJA. IRA.
Long is the way, and hard,
that out of hell leads up to light.
that out of hell leads up to light.
Sete Pecados Mortais é, todo ele, um filme sobre a cidade, a cidade como inferno, e sobre a apatia que dela emana e que afecta, de forma corrosiva e silenciosa, as sociedades modernas ocidentais. E depois, é claro, sobre uma das consequências dessa apatia levada ao extremo: a psicopatia de um John Doe, que se sente inspirado por Deus e que faz dos crimes calculados a sua obra-prima, como se por meio deles purificasse a humanidade e inspirasse o mundo.
Não é por acaso, note-se, que a maior banda sonora do filme é a banda sonora das cidades: um ruído ensurdecedor que invade cada cena, criando uma atmosfera tensa, agonizante e inevitavelmente poluída. A fotografia vive de um trabalho de iluminação portentoso, que se vê realçado pelo ambiente nocturno, negro e sombrio do meio urbano. As próprias personagens não se sentem bem na cidade, perdem-se na sua violência e infelicidade, caos e indefinição e procuram um escape, uma fuga possível. O detective William Somerset (Morgan Freeman, numa interpretação impecável), anseia por retirar-se do activo, procurando uma paz fora da cidade. Diz ele:
I just don't think I can continue to live in a place that embraces and nurtures apathy as if it was virtue. (...) it's easier to lose yourself in drugs than it is to cope with life. It's easier to steal what you want than it is to earn it. It's easier to beat a child than it is to raise it. Hell, love costs: it takes effort and work.
Quando entra num táxi, aliás, e lhe é perguntado para onde vai, rapidamente responde: far away from here. E quando Tracy Mills (Gwyneth Paltrow), também ela desgostosa com a mudança para a cidade, lhe pergunta how long have you lived here?, naquele amontoado de prédios e de almas perdidas, a resposta é imediata: too long. Quando à noite se deita, para finalmente descansar, põe o metrónomo no seu tic-tac, como se fosse possível marcar o ritmo da confusão. Como se fosse possível converter o tumulto infindável numa apaziguante ária de Bach. A desordem está, todavia, instalada.
John Doe marca, afinal, o novo crime: metódico e estudado, paciente e implacável. Os seus crimes são sermões e a sua resolução policial ganha contornos de quebra-cabeças.
We see a deadly sin on every street corner, in every home, and we tolerate it. We tolerate it because it's common, it's trivial. We tolerate it morning, noon, and night. Well, not anymore. I'm setting the example.
John Doe
E o crime baterá à porta de David Mills (Brad Pitt), inesperado, cruel e devastador, como poderá bater às portas de qualquer um de nós. E é esse factor que é tão assustador. Porque nos é, cada vez mais, tão próximo.
O argumento é subtil e detém passagens verdadeiramente memoráveis. Os desempenhos revelam genuína solidez, em especial o de Kevin Spacey como John Doe, que é perturbador e perfeitamente conseguido. Magnificamente realizado por David Fincher, o filme é um exercício de grande equilíbrio, subtileza e contenção. O final, então, é soberbo. Profundo. Magistral.
Sete Pecados Mortais é, pois, um marco incontornável do cinema policial, onde o suspense... ascende a um estado puramente sublime.
Ernest Hemingway once wrote: the world is a fine place and worth fighting for. I agree with the second part.
William Somerset
William Somerset
Um história que nos cativa até ao fim do filme, de olhos postos no ecrã até ao último minuto...
ResponderEliminarElogio este filme por ser bastante original, plo menos não vi até hoje nenhum filme que envolvesse os "Sete pecados"...
Aconselho :-p
Olá
ResponderEliminarConcordo com você Filipe. O filme é um marco sim, principalmente pelas cenas fortes e o suspense pertubardor, mas com certeza veio no vácuo de o Silêncio dos Inocentes.
até mais...
Fizeste muito bem e subires a nota.
ResponderEliminarAbraço
Muito bom posso aceitar mas "excelente" seria a nota perfeita:p
ResponderEliminarEstou a brincar pois cada um tem a sua opinião acerca do cinema.
Já agora, boa escolha de frases no teu post é realmente uma obra soberba em diálogos esplendorosos...
Abraços
Roberto, uma questão:
ResponderEliminarO que achaste do Brad Pitt?
É que não me sai da cabeça que ele está péssimo naquela cenaa final...
Abraço
Vou ser honesta, detestei o filme de tal forma que nunca fui capaz de o rever. Aquele final deu-me cabo dos nervos e todo o filme é, em si, doentio. Talvez seja o caso de eu ter visto o filme demasiado nova e susceptível para o conseguir compreender e valorizar. Ainda hoje não consigo deixar de ver um filme com o actor que faz de assassino sem me passar um calafrio pela espinha. Enfim, demasiado realista, demasiado próximo, demasiado cruel para nos mentalizarmos que não passa de um filme. As citações estão bem escolhidas: os pecados mortais estão ao virar de cada esquina e passamos por eles sem nos comovermos, de tal forma estão hoje aceites. Ok, acho que acabei de deprimir toda a gente...
ResponderEliminarANA: A história arquitecta-se com suspense do início ao fim e prende bastante, de facto. Também aconselho ;)
ResponderEliminarALTIERES BRUNO MACHADO JUNIOR: Sim, também acho que esteja na sombra d'O Silêncio dos Inocentes. Mas superou o filme de Jonathan Demme, na minha opinião.
JACKIE BROWN: Subi, de facto. Tenho a dizer-te que não é um filme ou um género que me "encha as medidas", como se costuma dizer. Mas tenho que ser justo e valorizar a obra pelo que realmente julgo que ela vale. Quanto a Brad Pitt: não acho que tenha um desempenho extraordinário neste filme, aliás nem Morgan Freeman. O grande desempenho é o de Kevin Spacey, apesar de tão curto. Mas, para te ser sincero, considero que a melhor parte da prestação de Brad Pitt neste filme está, inegavelmente, no final.
NEKAS: Certas passagens do argumento são, de facto, inteligentes e sublimes. Não é, como disse, um filme que me encha as medidas. Dou-lhe as 5 estrelas porque admiro a sua qualidade dentro de um género que raramente me satisfaz ;)
CLAUDIA GAMEIRO: Recomendo que o vejas novamente, então. Acho engraçado que o Kevin Spacey te suscite esse arrepio. Para mim ele é sempre o preguiçoso barrigudo de Beleza Americana ;) É um grande filme.
Cumps.
Roberto Simões
CINEROAD - A Estrada do Cinema
Esse filme é realmente um marco. O roteiro é ótimo e a direção do Fincher é imbatível.
ResponderEliminarVitor Silos
www.volverumfilme.blogspot.com
Sem dúvida influenciado por "Silence of the Lambs", "Seven" foi mesmo assim, à altura do seu aparecimento, um filme deveras original que despoletou depois uma série de "cópias", criando uma certa moda de thrillers envolvendo "assassínios em série".
ResponderEliminarFoi a partir daqui que David Fincher começou a dar nas vistas, abalançando-se para trabalhos mais consistentes ("Fight Club" e sobretudo o "Benjamin Button").
A Gwyneth Paltrow também se começou a evidenciar neste filme, Morgan Freeman está igual a si mesmo mas "Seven" ficará certamente datado como o "nascimento" de um grande actor - Kevin Spacey
VITOR SILOS: Subscrevo inteiramente ;)
ResponderEliminarRATO: Sem dúvida influenciado pel'O SILÊNCIO DOS INOCENTES, de Demme. Concordo totalmente. Pessoalmente prefiro o CLUBE DE COMBATE a'O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON, se bem que este último é absolutamente magistral. OS SETE PECADOS é um grande filme e um importantíssimo marco, quando muito não seja, na carreira de Fincher. Estamos de acordo.
Cumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Correndo o óbvio risco de me estar a esquecer de algum, ou estar a "classificar" mal outros, é o melhor do género que já vi. Sem grandes palavras.
ResponderEliminarDIOGO F: É porventura um dos melhores, sim. Para além d'O SILÊNCIO DOS INOCENTES, já referenciado no debate, também gosto imenso de A CELA, do Tarsem, se bem que esse também mergulha no onírico e no surreal.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Não conheço A CELA, mas acho este muito superior ao SILÊNCIO. Este conta com uma atmosfera muito própria, uma fotografia perfeita, este filme é uma obra de arte em todos os aspectos do que é fazer cinema. Em SILÊNCIO, acho que há uma prevalência do argumento em relação ao resto ...
ResponderEliminarDIOGO F: Também considero o filme de Fincher superior ao de Demme. Estou em sintonia.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Gosto. Muito!
ResponderEliminarNEUROTICON: Também eu, também eu ;)
ResponderEliminarDAN: E que vilão. Um papel relativamente curto, mas assombroso. Grande interpretação de Kevin Spacey num final fenomenal.
Cumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Gosto também muito. É daqueles filmes que arrebata qualquer um, de um realismo e suspense tremendos.
ResponderEliminarInterpretações credíveis, ambiente muito bem conseguido, como dizes na crítica, e argumento muito bem desenvolvido.
Também não é dos géneros que mais me enche as medidas, e prefiro igualmente este a Silence of the Lambs. Do Fincher elego mesmo o Benjamim Button como o que mais gostei, mas o Fight Club é outra pérola a descobrir.
abraço
JORGE: De acordo. Para mim, FIGHT CLUB - CLUBE DE COMBATE é não só o seu melhor filme como uma das mais geniais obras-primas da História do Cinema.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
O Benjamin Button é o seu pior filme. E o melhor é mesmo o Fight Club seguido deste e do The Game. Aquilo que mais admiro em Fincher é a sua capacidade em criar uma ambiência muito negra (até na bodega do Button o consegue). Claro que consegue criar bons planos (mas nada de extraordinário), claro que consegue imprimir em quase todos os seus filmes um ritmo alucinante e próprio dos thrillers (embora eu considere que a partir do Panic Room abandalhou bastante), mas quanto a mim é essa ambiência que faz dele um cineasta muito próprio e talentoso. Mas atenção, se continua nesta onde de Buttons e Zodiacs...
ResponderEliminarÁLVARO MARTINS: Sabes que partilho da tua opinião. Talvez não concorde apenas quando te referes a BENJAMIN BUTTON, pois acho que subvalorizas o filme. Mas de facto Fincher não mais é o mesmo: tanto em A SALA DA PÂNICO como em ZODIAC ou mesmo neste último BENJAMIN BUTTON e o trailer de SOCIAL NETWORK não promete o melhor. FIGHT CLUB é o melhor dele, seguido de SETE PECADOS MORTAIS e, sim, de O JOGO, poucas vezes referido entre nós e que é um filme excepcional.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Este filme é maravilhoso em todos os níveis. Se7en é realmente memorável. Vi-o na altura no seu fim-de-semana de estreia e foi um assombro de fime. Foi muito imitado também. (Também gosto muito de "A Cela" - foi antes dela se tornar J-Lo o que a tornou mais fraca como actriz para poder manter-se super mediática).
ResponderEliminarDavid Fincher realizou grandes filmes (eu por vezes vejo o Chris Nolan como um novo Fincher)... e este é um dos muitos dele dos mais maravilhosos.
Juntemos Alien 3, Fight Club, Panic Room, Zodiac e temos alguns dos seus mais excelentes filmes, que normalmente circulam com um clima opressivo. OK o Benjamim Button é bastante diferente... mas é igualmente bom.
Concordo com tudo aquilo que disseste, especialmente ao nível da banda sonora. De destacar ainda a entrada do Kevin Spacey no filme - excelente!
ResponderEliminarARM PAULO FERREIRA: Não sou, de todo, dos que menospreza o BENJAMIN BUTTON. É um clássico instantâneo. Mas é completamente distinto de toda a obra de Fincher até ao momento. Quanto aos SETE PECADOS, totalmente de acordo.
ResponderEliminarNUN0B: Por acaso nem acho que a banda sonora seja assim tão digna de destaque, apesar de pertencer a um grande compositor - Howard Shore. De resto, estamos então em sintonia.
Cumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Também gosto muito do The Game. Mas honestamente, e mesmo tendo obras que gosto bastante, David Fincher não me arrebatou por completo em nenhum dos seus filmes. Reconhecimento é o que impera aqui, na minha opinião. Consegue ser competente, muito às vezes, e criar sempre boas atmosferas em suspense. Será porventura este o facto (de os filmes serem thrillers) que não me preenche as medidas.
ResponderEliminarabraço
JORGE: Quem sabe. Agora CLUBE DE COMBATE e O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON não são propriamente thrillers, não é. E não percebo como podes guardar CLUBE DE COMBATE no mesmo saco dos outros. Mas pronto, deixemos essa discussão para a ficha do respectivo filme ;)
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Sim esses dois não são bem thrillers, mas ainda assim têm um aura e uma atmosfera muito característica de Fincher, parece-me, sobretudo Clube de Combate. O Benjamim Button de facto é o que mais se distancia, e é porventura por isso que se revela como o meu preferido.
ResponderEliminarabraço
JORGE: Sim, sobretudo CLUBE DE COMBATE. BENJAMIN BUTTON adopta uma postura romântica que não esperava da parte do realizador. CLUBE DE COMBATE é o meu favorito.
ResponderEliminarCumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «