★★★★
Título Original: The Visitor
Realização: Thomas McCarthy
Principais Actores: Richard Jenkins, Haaz Sleiman, Danai Jekesai Gurira, Hiam Abbass, Marian Seldes, Maggie Moore, Michael Cumpsty, Bill McHenry, Richard Kind, Tzahi Moskovitz, Amir Arison, Neal Lerner
AO RITMO DO DJEMBÉ
Walter vive uma inexistência. A mulher faleceu, o filho vive em Londres e tem-se a si mesmo numa solidão inerte. É professor universitário, mas não encontra significado nas suas acções. Não tem sonhos e a sua realidade é um puro bocejo. Crise da meia idade? Aparentemente, tão mais do que isso. A performance de Richard Jenkins é simplesmente fenomenal: e a sublinhar está tanto o adjectivo quanto o provérbio. Na verdade, a serenidade, a autenticidade e diria mesmo naturalidade com que o actor interioriza e exterioriza a sua personagem são notáveis. É uma interpretação inteira, desde o olhar à expressão facial, aos ombros... o mínimo movimento corporal ganha uma importância incrível, no meio de tanta calma e passividade. A intensidade do drama vem muito do extraordinário trabalho de contenção de McCarthy (e de todo o minimalismo potenciado pelos enquadramentos, pela fotografia e pela banda sonora, que nos foca no essencial, sendo o essencial a dimensão humana das personagens e do argumento), mas vem sobremaneira deste acting tocante, arrebatador e impossivelmente sincero.
O título é... um excelente título. Creio que o mais difícil seria conseguir com que fizesse sentido; acaba não só por fazer todo o sentido como por ser um dos maiores trunfos do filme. Afinal, e se nos ficarmos apenas pelas breves linhas da sinopse, como é que alguém que vê, de um dia para o outro, o seu apartamento em Nova Iorque ocupado por um casal de imigrantes ilegais pode ser o visitante? Percebemos, a priori, que é Walter o protagonista e acabaremos por concluir que o visitante aqui não vem de fora, mas de dentro. Inesperadamente envolvido em toda a história de Tarek e Zainab, é ele quem toma de assalto uma existência (só ela poderia justificar uma trama) e se vê a desenvolver afectos, que crescem à medida da redescoberta de si próprio: de que está vivo, de que sente e de que estará sempre a tempo para quebrar a rotina, caminhando para a realização e para a felicidade. Quando muito não seja, caminhando para o sentido.
Com a prisão de Tarek e a ameaça da deportação para a Síria (país de onde é original), dá-se o twist nada previsto no seu percurso. De repente, Walter tem alguém com quem se importar, algo por que lutar. A causa de Tarek torna-se a sua causa, levando-o a cessar todas as suas obrigações profissionais, toda a sua vida - qual vida?, perguntar-me-ia ele, muito provavelmente - para ajudar Tarek. Com a chegada de Mouna (luminosa Hiam Abbass), a mãe do estrangeiro, Walter ganhará inclusivé um brilho no olhar, há muito perdido. Há ocasiões que podem mudar uma vida ou, neste caso, acordar uma vida, há muito adormecida. O djembé será sempre um símbolo: a linguagem universal da música, capaz de unir os mais distintos seres humanos pelo sentimento, sem preconceito - coisa que a política norte-americana e o sistema social não faz, sobretudo no pós 11 de Setembro -, e a batida que lhe despertará o coração para uma nova vida. Ou, pelo menos, assim esperamos nós.
O Visitante numa só palavra? Humanidade.
O título é... um excelente título. Creio que o mais difícil seria conseguir com que fizesse sentido; acaba não só por fazer todo o sentido como por ser um dos maiores trunfos do filme. Afinal, e se nos ficarmos apenas pelas breves linhas da sinopse, como é que alguém que vê, de um dia para o outro, o seu apartamento em Nova Iorque ocupado por um casal de imigrantes ilegais pode ser o visitante? Percebemos, a priori, que é Walter o protagonista e acabaremos por concluir que o visitante aqui não vem de fora, mas de dentro. Inesperadamente envolvido em toda a história de Tarek e Zainab, é ele quem toma de assalto uma existência (só ela poderia justificar uma trama) e se vê a desenvolver afectos, que crescem à medida da redescoberta de si próprio: de que está vivo, de que sente e de que estará sempre a tempo para quebrar a rotina, caminhando para a realização e para a felicidade. Quando muito não seja, caminhando para o sentido.
Com a prisão de Tarek e a ameaça da deportação para a Síria (país de onde é original), dá-se o twist nada previsto no seu percurso. De repente, Walter tem alguém com quem se importar, algo por que lutar. A causa de Tarek torna-se a sua causa, levando-o a cessar todas as suas obrigações profissionais, toda a sua vida - qual vida?, perguntar-me-ia ele, muito provavelmente - para ajudar Tarek. Com a chegada de Mouna (luminosa Hiam Abbass), a mãe do estrangeiro, Walter ganhará inclusivé um brilho no olhar, há muito perdido. Há ocasiões que podem mudar uma vida ou, neste caso, acordar uma vida, há muito adormecida. O djembé será sempre um símbolo: a linguagem universal da música, capaz de unir os mais distintos seres humanos pelo sentimento, sem preconceito - coisa que a política norte-americana e o sistema social não faz, sobretudo no pós 11 de Setembro -, e a batida que lhe despertará o coração para uma nova vida. Ou, pelo menos, assim esperamos nós.
O Visitante numa só palavra? Humanidade.
You can't just take people away like that. Do you hear me? He was a good man, a good person. It's not fair! We are not just helpless children! He had a life! Do you hear me? I mean, do you hear me? What's the matter with you?
Um filme fantástico, brutal e que nos toca. Humanidade é a palavra certa. Bela crítica, Roberto. Brevemente escreverei uma sobre este filme e depois trocaremos impressões.
ResponderEliminarGrande Abraço.
CARLOS: Há quanto tempo ;) Não será fantástico ou brutal, digo eu, mas lá que nos toca é garantido. Quando publicares alguma coisa sobre o filme falaremos mais então.
ResponderEliminarRoberto Simões
» CINEROAD «
Sim não diria que se trata de um filme fantástico ou muito bom em qualquer departamento (exceptuando talvez a interpretação de Jenkins), mas que é de uma sensibilidade e contenção deliciosas lá isso é inegável. Destaco ainda a inserção da musicalidade no filme, de um sentido assaz inteligente e rítmico.
ResponderEliminarabraço
Gostei muito deste filme. Como o Jorge disse, pode não ser um filme fantástico mas está mesmo à (minha) medida. Adoro o Richard Jenkins e sem dúvida que tem aqui uma excelente interpretação, mas o filme não se apoia apenas nisso.
ResponderEliminarGostei muito desta crítica, fiquei com a sensação que o Roberto sentiu qualquer coisa de muito parecido com o que eu senti quando vi o filme. Teria escolhido a mesma citação, não só pelas palavras mas por toda a cena.
Cumprimentos
JORGE: Queres desenvolver esse aspecto da "inserção" da musicalidade no filme?
ResponderEliminarFILIPA LEITE ROSA: Bem-vinda ao CINEROAD.
Porventura, terei sentido, quem sabe. Se tivesse que escolher uma citação, não poderia escolher outra. Concretiza, pela voz de Jenkins, a cena crucial e mais emotiva do filme. Interessante perceber como a simples subida do volume da voz do actor, com um misto de agressividade, possibilita o momento mais alto do filme. Penso que diz muito sobre o filme.
Volta sempre!
Roberto Simões
» CINEROAD «
O filme tem uma banda-sonora pouco presente, digamos, que só se nota de vez em quando muito subtilmente, se não contarmos com o djembé, claro. Daí que a musicalidade do filme seja nos dada através da narrativa, do desenvolvimento psicológico e de mudança do protagonista, o que é interessante se pensarmos nas potencialidades que esse conceito possui, aqui exploradas mas talvez não tanto como gostaria.
ResponderEliminarabraço
Ainda não vi o filme mas fiquei bastante curioso quanto ao mesmo depois de ler a crítica.
ResponderEliminarCumprimentos,
Aníbal Santiago
JORGE: "Daí que a musicalidade do filme seja nos dada através da narrativa, do desenvolvimento psicológico e de mudança do protagonista" - a musicalidade é-nos dada através da narrativa como assim?
ResponderEliminarANÍBAL SANTIAGO: Vale a pena, é um bom filme que recomendo.
Roberto Simões
» CINEROAD «
Não é a música que fornece e contribui, de forma evidente e autónoma, para o desenrolar da acção, mas sim ao contrário, é a narrativa que dá música, que estabelece condições e meios para oferecer a componente sonora ao espectador. Normalmente fala-e muito do papel influenciador da banda-sonora num filme, da capacidade que tem para emocionar, guiar sensações, por vezes sensibilizar mesmo. No entanto aqui parece-me que não será tão óbvio dado que a música surge naturalmente por meio dos acontecimentos, do djembé, e nem nos apercebemos do seu potencial. Enfim só um apontamento, não é o único caso em que a banda sonora essencialmente corresponde a próprias sonoridades do argumento.
ResponderEliminarabraço
JORGE: Quando dizes "a narrativa que dá música" referes-te a música diegética (e aí estarás a falar exclusivamente das performances do djembé) ou a música não-diegética (e aí estarás a falar das composições de Jan A. P. Kaczmarek)? O que me causa maior estranheza no teu comentário é quando dizes que a "música surge naturalmente por meio dos acontecimentos". Naturalmente? Referes-te novamente à música diegética, é isso?
ResponderEliminarRoberto Simões
» CINEROAD «
Sim é isso, mas dou-te razão não fui totalmente esclarecedor, confundido os dois tipos de música. Mas sim refiro-me à música diegética (djembé) e não à composição de Kaczmarek, mais subtil, daí dizer que a narrativa nos dá música, ou o protagonista nos dá música literalmente, e por meio dela, dessa, os acontecimentos e as emoções surgem naturalmente como se de um vídeo real estivéssemos a assistir. Digamos que nesses tipos de situação se nota menos a influência dos intervenientes que fizeram o filme, e mais os intervenientes que "vemos", emocionando-nos simultaneamente ao mesmo tempo.
ResponderEliminarExistem outros casos no cinema, por exemplo estou-me a lembrar no Rear Window do Hitchcock em que a banda sonora corresponde sempre ao piano do vizinho, que toca de vez em quando. Aqui a música diegética quase que se pode considerar praticamente a banda sonora, a composição arquitectada para o filme. Continua a ser propositada e planeada pelo realizador é verdade, mas o realismo é maior.
abraço
JORGE: Estamos então totalmente de acordo, juro que não te estava a perceber. Penso que aqui mais banda sonora só prejudicaria. O filme tem uma forte carga emocional e não precisa da tanta música (Kaczmarek aliás é um grande compositor). Os silêncios falam mais alto e o minimalismo fica-lhe bem.
ResponderEliminarQuanto a JANELA INDISCRETA de Hitchcock, conto falar dessa obra em breve ;)
Roberto Simões
» CINEROAD «