domingo, 30 de outubro de 2011

GIGANTE (1956)

PONTUAÇÃO: EXCELENTE
★★★★
Título Original: Giant
Realização: George Stevens
Principais Actores: Elizabeth Taylor, Rock Hudson, James Dean, Carroll Baker, Jane Withers, Chill Wills, Mercedes McCambridge, Dennis Hopper, Sal Mineo, Rod Taylor, Judith Evelyn, Earl Holliman, Robert Nichols, Paul Fix, Alexander Scourby
Crítica:

O SANGUE QUE SEMEOU A TERRA

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.

Alguns filmes parecem, incompreensivelmente, esquecidos no tempo. De uma escala épica e impressionante, bela e esfíngica, Gigante chega até nós como um legado máximo da era de ouro de Hollywood. Magnificamente filmado (desde os íntimos close-ups sobre as personagens às panorâmicas de cortar a respiração) e fotografado (arrebatam-nos a intensidade das cores e os contrastes captados, as nuances e subtilezas da iluminação e dos jogos de sombras), o filme tem o mérito de nos transportar, por inteiro, para outro tempo e para outro lugar. Justamente aclamado como uma das obras maiores de Stevens, agraciada por uma magnífica banda sonora de Dimitri Tiomkin, Gigante parte do romance homónimo de Edna Ferber e eterniza uma saga familiar ao longo de três gerações. Romance e humor garantem-nos, ao longo de mais de três horas, o melhor entretenimento, excitante e espectacular, mas é no drama satírico que o filme descobre as fissuras do sonho americano e da humanidade. Do microcosmos ao macrocosmos, a história toca a totalidade e a universalidade. Elizabeth Taylor, Rock Hudson e James Dean encabeçam o elenco, com excelentes interpretações.

I. OS HOMENS E AS MULHERES

O argumento de Gigante (Fred Guiol e Ivan Moffat, notáveis na consistência da adaptação) centra a sua discussão na contraposição de conceitos. A primeira oposição tem que ver com as diferentes representações sociais do homem e da mulher. Elizabeth Taylor é Leslie, uma jovem bonita e sedutora, mas sobretudo culta, respondona e emancipada. Desfila, por entre grandiosos cenários, graciosos vestidos, mas é uma mulher de calças, se for preciso, pois tem ideias próprias e jamais se inibirá de as exprimir. Apaixonar-se-á pelo charmoso fazendeiro Bick Benedict (Rock Hudson) e trocará os campos verdes e férteis de Maryland pelas planícies tórridas, estéreis e empoeiradas do Texas (mais uma oposição, que realça desde logo a dificuldade de adaptação a um novo meio, naturalmente mais hostil e socialmente mais conservador). O assombro visual da imensidão da paisagem expõe, a priori, as evidências da mudança: aquela mansão no meio do nada é, só por si, simbólica. A sua recta arquitectura impõe austeridade; fazendo em muito lembrar a casa entre as searas do posterior Dias do Paraíso, de Malick.

Leslie será imediatamente confrontada com o seu novo papel de esposa - com aquilo que o marido e os outros esperam dela - mas a jovem jamais se resignará à passividade ou, pior, à inutilidade. É uma mulher moderna, que arregaça as mangas e reclama a notoriedade. Como dirá mais tarde à amarga e solteirona governanta, não quero ser uma mera hóspede em casa do marido. Há uma cena, após o almoço, em que Leslie interrompe a conversa de Bick e dos companheiros de negócios e intervém activamente na conversa. É um escândalo e o marido repreende-a: isto são assuntos de homens! Mais tarde, o machismo de Bick vem ao de cima, novamente, quando chega a hora do primeiro filho - o primogénito que abraçará toda a herança da família e conduzirá Reata para o futuro. Quis o destino que tivessem um par de gémeos, um menino e uma menina... Bick dedicar-se-á sempre mais ao filho do que à filha - coisas de homens, entendem? - mas o destino é traiçoeiro. Se o não é, pelo menos é traiçoeira a ideia de esperar dos nossos filhos aquilo que nós, pais, queremos e não aquilos que eles, filhos, querem para eles próprios.

Emblemática, a cena em que Bick obriga o filho de quatro anos a montar um pónei e depois um cavalo, quando a criança chora atemorizada e só encontra aconchego no colo da mãe e nos brinquedos de médico. Será um médico, nem mais, a filha apaixonar-se-á pelo genro inesperado, sonhará com uma casa pequena na cidade... Moral da história? Os planos saem todos furados aos pais, de nada adiantam as excessivas imposições ou o fazer dos filhos meros projectos. Os filhos são igualmente indivíduos, que mais tarde serão - eles também - pais, perpetuando o ciclo. Nuclear, por isso, a cena em que Leslie e Bick conversam à luz dos candeeiros de cabeceira, fazendo as cedências necessárias para aceitarem os futuros trilhos da descendência. No curso da vida, por fim, evolui a mentalidade, a educação e com elas a cultura e a sociedade. A brilhante montagem da dupla William Hornbeck e Robert Lawrence joga habilmente com a passagem do tempo diegético e revela-se essencial para o triunfo narrativo. Afinal, aquilo que se poderia tornar, facilmente, uma longa-metragem interminável e enfadonha, torna-se numa experiência extremamente prazerosa.

II. O RACISMO
Com a questão da intolerância racial, Gigante põe o dedo na ferida, especificamente no que se refere à discriminação doentia mas cultural dos americanos sobre os mexicanos. Estamos perante um filme patriótico, disso não há quaisquer dúvidas, mas que talvez por isso mesmo veja a pátria na sua multiculturalidade, sem ignorar as origens e o passado mal resolvido; é Leslie quem, ainda em Maryland e antes do casório, confronta Bick com o caso da expropriação das terras aos mexicanos, no estado do Texas. Apesar da perspectiva unilateral da denúncia, o filme é não só claro como acerrimamente crítico na sua mensagem. O racismo prolifera pela educação que passa de pais para filhos, na ilusão da superioridade, da cultura dominante.

Quando Leslie e Jett Rink (James Dean) chegam à vila de Reata, a senhora fica horrorizada perante uma povoação doente e à qual os Benedict ou quaisquer americanos negam cuidados médicos. Leslie personifica, pois, o arauto da mudança: enviará o médico da família à vila e salvará da morte certa o pequeno Ángel. Ángel, mais tarde, integrará o exército e servirá o país na guerra, sendo um motivo de orgulho para a terra. Ironia do destino, o filho mais velho de Leslie e Bick casará com uma latina, desafiando todo o código de costumes e a aceitação de um futuro neto mestiço. É por demais revoltante, por exemplo, a cena em que a pobre Juana é humilhada no salão de beleza do hotel, potenciando toda a confusão no jantar de homenagem a Jett, self-made man, agora magnata do petróleo. O funeral de Ángel, que regressa a casa como defunto herói de guerra, prenunciava já uma mudança de mentalidade. Bick levava aos familiares da vítima as condolências e uma bandeira do Texas, em sinal de aceitação derradeira. No fim da cena, ambas as bandeiras, a americana e a texana, ondulavam ao sabor do vento, sobre o caixão do militar.

Já perto do desfecho da obra, o famoso banquete de pancadaria em pleno restaurante de hamburgueres, em que Bick se bate em defesa dos mexicanos, tomando-os por iguais. A cena é mais demorada do que seria de esperar; tem um significado romântico, como acabamos por concluir. É naquele instante que Leslie vê no marido um herói, tendo a certeza de que tudo o que viveram valeu a pena. Vence a tolerância, numa cena gratuitamente intolerante para o espectador. O racismo é, contudo e ainda hoje, uma das tendências de pensamento mais fracturantes na sociedade americana ou, pelo menos, uma das mais resistentes.

III. A TERRA E O DINHEIRO

Gigante é, também, sobre a prosperidade económica do Texas e da América, a partir do segundo quartel do século XX. É sobre a transição da produção pecuária para a produção petrolífera, sobre a alteração da paisagem: onde outrora pastavam hectares de gado passam a erguer-se repetidas e altas torres, extractoras de ouro negro, que ferem o solo mas reconfortam a carteira. É a concretização do sonho americano para o jovem Jett Rink, que desde sempre se imaginou longe do texas e a enriquecer. Nunca ninguém deu nada por ele, sobretudo Bick Benedict, que o detestava. Somente a governanta do rancho gostava dele, a mesma que sempre lhe ensinou que mais vale um punhado de terra do que um rio de dinheiro, a mesma que sempre o protegeu do infortúnio.

Quando ela morre e, em sua homenagem, decidem atribuir a Jett ou uns poucos hectares de terra ou o dobro do valor dessa mesmíssima terra, em dólares, não é por acaso que o desgraçado recusa o dinheiro e aceita a terra. Em breve, descubrirá nela petróleo, rios de petróleo, e passará de um coitado de Deus a um produtor de sucesso, de um produtor de sucesso a um empresário exportador, de exportador a milionário e magnata, a excêntrico, poderoso e famoso homem de negócios, dono - imagine-se - de uma companhia aérea; qual Howard Hughes. Quem diria. Jett tentará, por uma e outra vez, comprar o rancho de Bick, mas o Benedict jamais cederá a herança dos seus antecessores. Resistirá à mudança, mas com o tempo render-se-á à produção petrolífera, que o enriquecerá também, ainda mais. É a vitória do capitalismo imparável sobre os velhos costumes, é uma viragem crucial na identidade económica e nacional.

James Dean é simplesmente brilhante enquanto Jett Rink. Que performance assombrosa, que cresce à medida que os anos passam e os cabelos brancos chegam; o envelhecimento é por demais credível. No final, o balanço: um homem rico, muito rico, mas só, muito só. Alcoolizado, preconiza a sua queda, numa vida sem sentido para lá da ambição e do trabalho árduo. Tantos bens materiais para quê? Quando morremos, deixamos cá tudo e não levamos nada. A única coisa que podemos deixar é a saudade e a única coisa que podemos levar, espero, é a memória do amor que sentimos enquanto estivemos vivos. A quem deixará Jett Rink saudade? Que memória de amor levará consigo para a eternidade? Admite, finalmente, ter amado Leslie toda a vida, mas nunca consumou esse amor. Eis, pois, a mais importante lição de todas. Gigante acaba por constituir, dessa forma, uma clarividente elegia sobre a humanidade.

Sinceramente, admira-me como uma obra com a monumentalidade de Gigante possa algum dia ser esquecida. Mas porque será, então, tão poucas vezes mencionada? Que glorioso pedaço de cinema. Um daqueles filmes de uma vida.


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Crítica nomeada para Melhor Crítica nos TCN Blog Awards'11

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

FÚRIA DE VIVER (1955)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
Título Original: Rebel Without a Cause
Realização: Nicholas Ray
Principais Actores: James Dean, Natalie Wood, Sal Mineo, Jim Backus, Ann Doran, Corey Allen, William Hopper, Rochelle Hudson, Dennis Hopper, Edward Platt, Steffi Sidney, Marietta Canty, Virginia Brissac, Beverly Long

Crítica:

JUVENTUDE REBELDE

If I had one day when I didn't have to be all confused and I didn't have to feel that I was ashamed of everything. If I felt that I belonged someplace. You know?
Jim

Haverá sempre um conflito geracional, que se acentua na adolescência. Insatisfeitos, inconformados, problemáticos e explosivos, os jovens sentem-se deslocados do mundo na procura de um lugar só seu, na procura da sua identidade. Discutem com os pais, discordam deles e da sua educação, sentem-se incompreendidos e revoltam-se. Sem paciência para hipocrisias, testam os seus limites como se fossem imortais - assim são os jovens em Fúria de Viver e assim é o retrato dos jovens de hoje e sempre.

James Dean imortalizou-se como ícone da juventude, em toda a sua ambiguidade: ternura e violência, que combinação mais improvável e provocante, não? No entanto, e por isso mesmo, tão real. Em parceria com o realizador Nicholas Ray concebeu aquela que é, provavelmente, a sua interpretação mais visceral. Dean é Jim: em colisão com a educação que recebe da família, arrisca a vida com irresponsabilidade, em nome da honra, só se envolvendo em confusões e em problemas sucessivos. No seu caso, as contradições entre o pai e a mãe funcionam mesmo como agente de disfuncionalidade:

You're tearing me apart!
You say one thing, he says another, and everybody changes back again.
Jim

Na acção, é por acaso que se entrecruzam na prisão, pela primeira vez, as três personagens centrais do filme - Jim, Judy e Platão -, mas não é por acaso que isso narrativamente acontece, claro. Não é por acaso que o filme abre na prisão. A prisão é local para onde vão todos aqueles que não respeitam a lei e a ordem. A prisão simboliza o futuro e a condenação da delinquência. Eis, pois, um prenúncio da acção que se seguirá. Três jovens, todos de boas famílias, cuja aparência ditaria, à partida, a felicidade, mas cuja a amizade servirá para sarar as demais feridas da alma. A amizade como construção de uma nova família, com novos ideais, como suporte fundamental.

O introvertido Platão (Sal Mineo) apaixonar-se-á por Jim, encontrando finalmente um amigo e um escape para os seus traumas e frustrações de infância, nomeadamente o abandono por parte dos pais. Marcará contraponto com o protagonista, cujas causas da rebeldia nascem no seio familiar. E Jim apaixonar-se-á por Judy (Natalie Wood), a menina bonita cujos beijos carinhosos o pai não aceita mais (temendo pela sua imagem pública ou quem sabe pelos seus desejos) e cujos amigos são meros idiotas para se divertir e sentir integrada. Um deles, Buzz, parece mesmo ser seu namorado, pelo que a aproximação de Jim não é, de todo, bem-vinda. I don't want any trouble, previne Jim, mas sem efeito. Terá lugar entre eles um perigoso duelo de facas, às portas do planetário. Mais tarde, a desafiante corrida para o precipício, que culminará de forma irreversivelmente trágica.

Buzz: You know something? I like you.
Jim: Why do we do this?
Buzz: You've gotta do something. Don't you?

Perante os contornos do crime, sobressai a incoerência da educação dos pais de Jim: o rapaz quer entregar-se à polícia, fazer o que está correcto e em nome da sua protecção a mãe é a primeira a dizer para não o fazer. O choque e sequente rebeldia parecem, pois, inevitáveis e inerentes à condição adolescente. Contudo, mostra-se tão ténue a fronteira entre a irreverência e a comum indisciplina e criminalidade fortuita. O desvio, o início do mau caminho... Fúria de Viver será, em última instância, sobre a violência em potência dentro de cada um de nós. Todo o ser o humano pode ser bom ou mau ou bom e mau ao mesmo tempo, consoante as circunstâncias da vida nos levem a revelar o melhor ou pior de nós. Sobretudo na juventude, em que o papel social dos indivíduos é indefinido. O filme apela à reflexão dos pais, mas estou certo de que também à dos filhos.

Socialmente crítico, consciente e depois influente, desde a coincidência do retrato com os espectadores ao culto e imitação do visual de James Dean (t-shirt branca, jeans e blusão vermelho), Nicholas Ray filmou um drama real com inegável elegância e apuro (note-se como isso ecoa nas cores e na iluminação - o filme estava inicialmente previsto para ser filmado a preto e branco - ou até, a nível narrativo, na própria cadência da montagem). Enfim, mais um clássico intemporal, estrelado por James Dean.

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Nota especial para infeliz escolha do título português.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A LESTE DO PARAÍSO (1955)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
Título Original: East of Eden
Realização: Elia Kazan
Principais Actores: James Dean, Julie Harris, Raymond Massey, Burl Ives, Richard Davalos, Jo Van Fleet, Albert Dekker, Lois Smith, Harold Gordon, Nick Dennis

Crítica:

UM TOQUE DE MALDADE

A Leste do Paraíso revitaliza o mito bíblico de Caim e Abel, a partir do aclamado romance de John Steinbeck, que lhe dá nome. Para protagonista, Elia Kazan e os produtores da Warner Bros. escolheram o atraente e (eternamente) jovem James Dean, hipnotizante e absolutamente memorável no papel de Cal. Selvagem, impulsivo, imprevisível, incompreendido ou simplesmente incompreensível, é um de dois irmãos, órfãos de mãe desde a nascença, que cresceu sob a educação de um inventivo pai (Raymond Massey), um homem profundamente religioso, moralista e rígido nos seus valores, mas um bom homem, acima de tudo. Desde cedo que Cal se mostra revoltado com o mundo, lutando pela atenção e aprovação do pai, sentindo-se preterido em relação ao irmão, que é estudioso, educado e exemplar. Cal não é somente um exemplo de juventude irreverente, contestatária e problemática; é mais do que isso. É como se, de alguma forma, fosse um agente de maldade, como se tivesse um mau íntimo que o levasse a magoar toda a gente à sua volta, particularmente aqueles que mais o amam e especialmente o seu pai. Estará, a origem do Mal, na falta de amor?

It's awful not to be loved. It's the worst thing in the world. (...) It makes you mean, and violent, and cruel. And that's the way Cal has always felt, Mr. Trask. All his life! Maybe you didn't mean it that way - but it's true. You never gave him your love. You never asked for his. You never asked him for one thing.
Abra

Quando descobre que a mãe afinal não morreu e que viveu, por isso, toda uma mentira, o conflito interior de Cal adensa-se e passa a exteriorizar-se com maior intensidade. Afinal, é violento, saber-se que fomos abandonados, que não somos amados. Julie Harris é Abra, a namorada do irmão, que primeiro o estranha e teme, mas que depois se identifica com ele, ao ponto de se sentir atraída por ele e pela sua ambiguidade. O triângulo amoroso ganha contornos mais delineados. Abra acaba por tornar-se uma personagem central, na medida em que marca a ponte entre o Bem e o Mal e se mostra compreensiva para com o protagonista. Cal sente-se finalmente compreendido por alguém. Na tentativa de se sentir amado, Cal tentará conquistar o amor do pai, empenhando-se de corpo e alma na sua missão. O drama e o melodrama atingirão, cada vez mais, uma carga fortemente emotiva. O final então é arrebatador, de partir o coração, verdadeiramente. A súplica desesperada de Cal pelo amor do pai... A frustração de, por uma última vez, falhar a redenção, a expiação da culpa e a sonhada reconciliação... O confronto com a verdade, o homicídio ainda que metafórico do irmão... uma sucessão de acontecimentos que precipitam a tragédia.

I've been jealous all my life. Jealous, I couldn't even stand it. Tonight, I even tried to buy your love, but now I don't want it anymore... I can't use it anymore. I don't want any kind of love anymore. It doesn't pay off.
Cal

Um magnífico portento, do argumento às assombrosas interpretações e a todas as qualidades técnicas que o valorizam como um todo. A Leste do Paraíso impõe-se como um clássico absoluto.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

OS CAVALEIROS (1959)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
Título Original: The Horse Soldiers
Realização: John Ford
Principais Actores: John Wayne, William Holden, Constance Towers, Judson Pratt, Hoot Gibson, Ken Curtis, Willis Bouchey, Bing Russell, O.Z. Whitehead, Hank Worden, Chuck Hayward

Crítica:

A MISSÃO DOS AUDAZES

War isn't exactly a civilized business.

Guerra Civil Americana, 1863. As duas frentes inimigas estão prestes a colidir, uma vez mais. Os Cavaleiros acompanha a liderança do rígido coronel Benjamin H. Grierson (John Wayne) sobre as suas tropas. No terreno, a guerra é um universo de homens: duros, bravos e com bastante sangue frio. Na incessante luta pelo ideal nacional, não há lugar para fraqueza ou desistência e só um comando forte pode conduzir à vitória.

Ninguém lhe faz frente, a Grierson, até à chegada do major Henry Kendall (William Holden), médico e cirurgião, que lhe desobedecerá várias vezes em prol da saúde e das vidas de soldados e vítimas colaterais dos confrontos. O filme assentará essencialmente no conflito entre ambos, encontrando o seu clímax num acalorado duelo, sendo que ao mesmo tempo cresce - e aí é que reside a particularidade desta relação - uma amizade sólida entre os dois militares. Outra relação contraditória, na qual assenta a narrativa do filme, é aquela que se estabelece entre ambos e a deslumbrante e destemida Miss Hannah (que deixa perceber o machismo daquela cultura). Apesar do humor e da acção espectacular, temos no cerne deste western de guerra as relações humanas. Nada de novo, portanto, num western de John Ford.

Poderemos dizer que Os Cavaleiros é mais um western de John Ford e, ao dizê-lo, sabemos de antemão que só poderemos estar perante mais um grande filme. Impecável a nível técnico, sobretudo na fotografia de William H. Clothier.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO (1988)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
Título Original: The Last Temptation of Christ
Realização: Martin Scorsese
Principais Actores: Willem Dafoe, Harvey Keitel, Paul Greco, Steve Shill, Verna Bloom, Barbara Hershey, Roberts Blossom, Barry Miller, Gary Basaraba, Irvin Kershner, Victor Argo, Michael Been, Paul Herman, John Lurie, Leo Burmester

Crítica:

O CRISTO PROIBIDO

I am the saint of blasphemy.

Depois de dezenas de representações de Cristo no cinema, todas mais ou menos consensuais (se não tivermos em conta, sobretudo, a versão superstar), eis que nos deparamos com aquela que será, porventura, uma das mais chocantes, ousadas e irreverentes. A partir do romance Nikos Kazantzakis, livremente baseado nas segradas escrituras, A Última Tentação de Cristo propõe-nos um retrato polémico e controverso, onde Jesus, mais do que o messias divinizado que os textos eternizaram, nos surge finalmente como um homem - um homem agoniado pelos seus conflitos interiores, duvidando da sua fé e da sua missão, sentindo o medo, o ódio e a culpa e desejando o pecado da carne como qualquer outro homem. Um homem dotado de livre arbítrio que, em última instância, se eternizou por vontade própria.


Father, will you listen to me? Are you still there? Will you listen to a selfish, unfaithful son? I fought you when you called, I resisted! I thought of no more. I didn't want to be your son! Can you forgive me?

A representação, pouco ortodoxa, atentará facilmente contra os mais devotos, mas é somente mais uma representação (que responde, claro está, a uma necessidade contemporânea de humanizar e desmistificar a figura histórica de Cristo). A questão é pertinente: se lembrarmos a alucinação de Cristo às portas da morte (que por si só justifica o título da obra), recordar-nos-emos daquela emblemática cena em que Jesus reencontra o cego-alvo-de-milagre a espalhar a palavra e a retratar o Filho de Deus, sendo que o próprio Filho de Deus não se revê nas suas palavras. Até que ponto não terão romanceado, os evangelhos, a vida e a palavra de Cristo, atendendo aos mais variados propósitos?



I'm a liar. A hypocrite. I'm afraid of everything. I never tell the truth. I don't have the courage. When I see a woman, I blush and look away. But inside I have lust. For God, I smother the lust, and that satisfies my pride. But my pride destroys Magdalene. I never steal or fight, or kill... not because I don't want to but because I'm afraid. I want to rebel against everything, everybody... against God!... but I'm afraid. If you look inside me you see fear, that's all. Fear is my mother, my father, my God.

O argumento Paul Schrader suscita um questionamento contínuo e uma reflexão profunda sobre a natureza das crenças instaladas, particularmente sobre as religiões cristãs. O twist final eleva, num cúmulo criativo, toda esta mensagem do filme. Enfim, grande exercício dramatúrgico, magistralmente filmado por Scorsese. Willem Dafoe compõe um Cristo memorável, em toda a complexidade que o papel exigia.
Peter Gabriel experimenta-nos as emoções, pela inspiração da música. A produção artística, dos cenários ao guarda-roupa, confere autenticidade à viagem no tempo e a fotografia de Michael Ballhaus perpetua a aridez do deserto na solidão da alma.


Mais um exemplo da versatilidade e da qualidade do cinema de Scorsese.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

OS TENENBAUMS - UMA COMÉDIA GENIAL (2001)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
Título Original: The Royal Tenenbaums
Realização
: Wes Anderson

Principais Actores: Gene Hackman, Anjelica Huston, Gwyneth Paltrow, Ben Stiller, Owen Wilson, Luke Wilson, Bill Murray, Danny Glover, Seymour Cassel, Kumar Palana, Alec Baldwin, Grant Rosenmeyer, Jonah Meyerson

Crítica: [Brevemente]

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

EDUARDO MÃOS DE TESOURA (1990)

PONTUAÇÃO: BOM
Título Original: Edward Scissorhands
Realização: Tim Burton
Principais Actores: Johnny Depp, Winona Ryder, Dianne Wiest, Anthony Michael Hall, Vincent Price

Crítica: Eduardo Mãos de Tesoura é das fantasias mais ternurentas e infantis que Tim Burton concretizou em live-action, onde brilham e contrastam as cores berrantes dos cenários, o corte e costura do guarda-roupa ou a sofisticação da caracterização e penteados. Conta com uma comevedora interpretação de Johnny Depp, que na maioria das cenas nos arrebata apenas com o olhar. O cómico de situação (aliado à sátira social: o que as mulheres fazem na ausência dos maridos concede ao filme algumas das suas cenas mais hilariantes) e o cómico de personagem (cada uma mais caricata do que a outra, aqui estereotipadas e caricaturizadas ao sabor da fábula) fazem-se balançar com a tragédia de Eduardo (desde a sua incompleta criação à inadaptação insuperável, ao amor impossível e à eterna solidão). Por tudo isto e tanto mais, Eduardo Mãos de Tesoura tem o dom de nos aquecer o coração.


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CINEROAD ©2020 de Roberto Simões