★★★★★
Título Original: Det sjunde insegletRealização: Ingmar Bergman
Principais Actores: Max von Sydow, Gunnar Björnstrand, Bengt Ekerot, Nils Poppe, Bibi Andersson, Åke Fridell, Maud Hansson, Gunnel Lindblom
Crítica:
Quem és tu?
O JOGO DE XADREZ
Sou a Morte.
Passada uma década de sangrentas e distantes cruzadas, o cavaleiro Antonius Block (Max von Sydow) torna a casa. Na viagem de regresso, encontra um país assolado pela peste e pelo medo, pela superstição e pela repressão da Igreja. O cenário é o dos Dias do Fim. O Apocalipse, anunciado na Bíblia, parece ter chegado. Na praia, enquanto medita a existência, cruza-se um dia com a imponente e altiva figura de negro: a própria Morte acabara de aparecer, tencionando levá-lo para sempre. O cavaleiro propõe-lhe, contudo, uma partida de Xadrez. A condição é continuar a viver se a derrotar, pois gostaria de descobrir, antes de partir, o real sentido da vida. A Morte, segura de si, aceita o desafio e permite-lhe um adiamento.
Quero confessar-me, mas tenho o coração vazio - confessa o cruzado. - Vazio, como um espelho virado para a minha própria cara. Vejo a minha imagem e sinto nojo e medo. Pela minha indiferença para com os meus semelhantes, fui marginalizado quanto ao companheirismo. Agora vivo num mundo assombrado, prisioneiro dos meus sonhos e fantasias.
Quero obter o Conhecimento. (...) É tão inconcebível chegar a Deus apenas pelos sentidos. Porque é que ele se esconde numa atmosfera de promessas vagas e de milagres invisíveis? Como podemos ter fé nos fiéis, se não a temos em nós próprios? Que acontecerá àqueles que não podem ter fé ou àqueles que não a querem ter? Porque não posso eu destruir o Deus que há em mim? Porque é que Ele vive em mim, penosa e humilhantemente, ainda que O maldiga e O queira arrancar do coração? Porque é que, apesar de tudo, Ele é uma realidade para mim? (...) Não quero fé, nem presunção, mas Conhecimento. Quero que Deus me estenda a mão, se mostra e me fale.
Há que criar uma imagem do nosso medo e chamar-lhe Deus. (...) A minha vida tem sido de perseguição, caça e movimento, de conversas sem significado ou sentido. Tem sido um nada.
Quero obter o Conhecimento. (...) É tão inconcebível chegar a Deus apenas pelos sentidos. Porque é que ele se esconde numa atmosfera de promessas vagas e de milagres invisíveis? Como podemos ter fé nos fiéis, se não a temos em nós próprios? Que acontecerá àqueles que não podem ter fé ou àqueles que não a querem ter? Porque não posso eu destruir o Deus que há em mim? Porque é que Ele vive em mim, penosa e humilhantemente, ainda que O maldiga e O queira arrancar do coração? Porque é que, apesar de tudo, Ele é uma realidade para mim? (...) Não quero fé, nem presunção, mas Conhecimento. Quero que Deus me estenda a mão, se mostra e me fale.
Antonius adopta, pois, um forte e determinado posicionamento crítico, questionando os alicerces e as fundações da fé. Denota, por isso, uma tremenda angústia existencial. Creio que é compreensível: durante anos batalhou em nome da cruz e da religião dos Homens, mas nunca teve provas do divino. Que evidências sustentarão a sua atitude e justificarão os actos que praticou? Que absolvição terá? Afinal, muitas foram as vezes em que chamou por Deus na escuridão. O infindável e misterioso Silêncio foi a única resposta que sempre obteve.
Há que criar uma imagem do nosso medo e chamar-lhe Deus. (...) A minha vida tem sido de perseguição, caça e movimento, de conversas sem significado ou sentido. Tem sido um nada.
(...) Não se pode viver enfrentando a Morte, sem possuir qualquer conhecimento.
Mal sabia o cavaleiro que o ouvinte do outro lado era traiçoeiro e desonesto. A Morte perseguia-o e procurava escutar a sua estratégia de jogo. Quantas vezes mais não teria a sua esperteza que superar a da Morte para conseguir vencer a partida? Ou melhor, seria possível alguma vez levar a melhor sobre a Morte? Qual Dom Quixote, também a sua viagem será de perguntas e respostas, de profundas indagações teológicas e filosóficas. E qual personagem quixotesca, também o contraponto deste plano etéreo se fará, a jeito de comic relief, com um terreno e pragmático Sancho Pança, cheio de graça e de bom humor:
Von Sydow, Bengt Ekerot e cada elemento do elenco secundário é absolutamente excepcional. Grandes performances, grande história. Notas especiais para o subtil trabalho de montagem (Lennart Wallén), para a imprescindível banda sonora (Erik Nordgren), para a extraordinária concepção cénica (P.A. Lundgren) e para o incrível preto e branco (Gunnar Fischer).
O Conhecimento em vida far-se-á apenas pela máxima horaciana carpe diem; é esse o único conhecimento do qual o cavaleiro se apercebe: regido por tamanho princípio, cada momento da sua vida valerá muito mais e saberá muito melhor, que nem morangos silvestres no alto de uma colina, ao entardecer. Nada irrita mais a Morte do que um sorriso sincero ou a ideia de um dia bem passado. O fim de todas as coisas, esse, é inevitável e tudo o resto jamais será atingido. A Ceifeira ou o ser metafórico, como é chamado uma vez por uma das personagens, espera-nos a todos, mais tarde ou mais cedo - e, sabemo-lo, os peões são mesmo os mais susceptíveis ao adeus da partida. Seguem-se-lhes as torres, os cavalos e os bispos, a rainha e o rei. À eternidade somente ascendem os artistas, como preconiza o magnífico final, pleno de simbolismo. Para esses, o jogo far-se-á no Tempo que há-de vir. Talvez por isso não constem artistas no jogo de Xadrez.
O Sétimo Selo transcende, igualmente, qualquer partida do Tempo e da Morte. É eterno e uma das obras máximas do cinema mundial. De uma sublimidade inquestionável. Xeque-mate.
Sou o escudeiro Jons. Escarneço da Morte, rio-me de nosso Senhor e de mim próprio e sorrio para as raparigas! (...) As cruzadas são um disparate, só um tolo ou um idealista as poderia ter inventado.
A obra-prima de Ingmar Bergman equilibra-se magistralmente sobre estas duas dimensões: de um lado o erudito, o filosófico, o existencial, de outro o mundano e as trevas da ignorância, de quem quer simplesmente viver - há quem se divirta entre o álcool e as mulheres das estalagens, quem cante e dance até cair de cansaço, quem ceda ao pranto e às lamúrias, quem roube os mortos e quem queime as bruxas e quantos dormem com o diabo, como se pelo fogo purificassem o espírito dos profanos. Morreremos todos com a Peste Negra: é esse o castigo de Deus e é esse o augúrio dos monges profetas, que se aproveitam das gentes espalhando o medo e o terror. Os populares interiorizam-no sem cepticismos, deleitando-se no pecado e nos prazeres da vida. As suas sepulturas abrir-se-ão, com o tempo. E tanto para Antonius Block como para as outras personagens, os encontros com a Morte suceder-se-ão, muitas vezes definitivos.Von Sydow, Bengt Ekerot e cada elemento do elenco secundário é absolutamente excepcional. Grandes performances, grande história. Notas especiais para o subtil trabalho de montagem (Lennart Wallén), para a imprescindível banda sonora (Erik Nordgren), para a extraordinária concepção cénica (P.A. Lundgren) e para o incrível preto e branco (Gunnar Fischer).
O Conhecimento em vida far-se-á apenas pela máxima horaciana carpe diem; é esse o único conhecimento do qual o cavaleiro se apercebe: regido por tamanho princípio, cada momento da sua vida valerá muito mais e saberá muito melhor, que nem morangos silvestres no alto de uma colina, ao entardecer. Nada irrita mais a Morte do que um sorriso sincero ou a ideia de um dia bem passado. O fim de todas as coisas, esse, é inevitável e tudo o resto jamais será atingido. A Ceifeira ou o ser metafórico, como é chamado uma vez por uma das personagens, espera-nos a todos, mais tarde ou mais cedo - e, sabemo-lo, os peões são mesmo os mais susceptíveis ao adeus da partida. Seguem-se-lhes as torres, os cavalos e os bispos, a rainha e o rei. À eternidade somente ascendem os artistas, como preconiza o magnífico final, pleno de simbolismo. Para esses, o jogo far-se-á no Tempo que há-de vir. Talvez por isso não constem artistas no jogo de Xadrez.
O Sétimo Selo transcende, igualmente, qualquer partida do Tempo e da Morte. É eterno e uma das obras máximas do cinema mundial. De uma sublimidade inquestionável. Xeque-mate.