PONTUAÇÃO: BOM
★★★★
Título Original: The Ten Commandments
Realização: Cecil B. DeMille
Principais Actores: Charlton Heston, Yul Brynner, Anne Baxter, Edward G. Robinson, Yvonne De Carlo, Debra Paget, John Derek, Cedric Hardwicke, Nina Foch, Martha Scott, Judith Anderson, Vincent Price, John Carradine, Olive Deering, Douglass Dumbrille
Crítica:
O PREDESTINADO
So let it be written, so let it be done.
Uma das mais belas histórias da Bíblia obteve, no ano de 1956 e graças à ambição sem limites de Cecil B. DeMille, a sua melhor adaptação cinematográfica - em live action - de que há memória. O bebé hebreu que é abandonado nas águas do Nilo, numa arca de juncos, no tempo em que Ramsés I proibia a procriação do povo de Deus e o escravizava arduamente, é recolhido na corte do Faraó e feito Príncipe do Egipto, desconhecendo o seu passado e a sua origem.
Memnet:
Do you know the pattern of this cloth?
Bítia:
If my son is wrapped in it, it is a royal robe!
Mais tarde, ao descobrir a sua verdadeira identidade, Moisés decide juntar-se aos seus e conhecer o outro lado do chicote.
If this god is God, he would live on every mountain, in every valley. He would not be the god of Ishmael or Israel alone, but of all men. It is said he created all men in his image. He would dwell in every heart, every mind, every soul.
Expulso do Egipto pelo próprio Faraó, e após a desolação do deserto, encontrará Deus no cimo do Monte Sinai, onde Ele o iluminará e o incubirá da missão de libertar o seu povo da escravidão, de encontro à Terra Prometida, Canaã, desafiando Ramsés e todo um Egipto que o adoptara de braços abertos.
O filme levanta questões pertinentes: serão os homens propriedade do estado, de um ditador como Ramsés, ou livres almas sob Deus?
God made men. Men made slaves.
O argumento, escrito a quatro mãos (Æneas MacKenzie, Jesse Lasky Jr., Jack Gariss e Fredric M. Frank) consiste num exercício de escrita assaz prodigioso, que possibilita uma metragem de aproximadamente 220 minutos a partir de uma história que, nas sagradas escrituras, se resume em poucas páginas. Um dos maiores encantos da obra reside, precisamente, nesses instantes maravilhosos em que a eloquência das declamações, embebida na poética dos evangelhos e protagonizada tanto pelos actores como pelo narrador, nos arrebatam por completo. A magnífica banda sonora de Elmer Bernstein constitui, também, uma das dádivas maiores da obra. No momento da travessia do Mar Vermelho, então, e juntamente com a espectacularidade dos revolucionários efeitos especiais (John P. Fulton), possibilita um clímax absolutamente deslumbrante, impressionante e apoteótico, que se estende até ao episódio do forjamento dos dez mandamentos.
There's no freedom without law.
Os valores de produção são verdadeiramente monumentais: não só os já referidos efeitos especiais, mágicos e notáveis ao logo de toda a obra, como os cenários (Hal Pereira, Walter H. Tyler, Albert Nozaki, Sam Comer, Ray Moyer) que, do mais ínfimo pormenor ao mais imponente e vistoso ídolo de um Egipto no seu máximo esplendor arquitectónico, são de um trabalho majestoso e extraordinário, capaz de justificar, por si só, o valioso orçamento da obra. O guarda-roupa (Edith Head, Ralph Jester, John Jensen, Dorothy Jeakins, Arnold Friberg) é rico, luxuoso e exuberante, com uma panóplia de corte e costura notável! Desfilam as mais variadas cores e texturas, enchendo o ecrã de uma pura beleza visual.
Ainda que nem sempre o DeMille-realizador esteja na sua melhor forma, nomeadamente na primeira parte da obra em que o ritmo e a dinâmica se tornam, por vezes, um tanto ou quanto fastidiosos, e o movimento de câmera não se encontra particularmente inspirado, é na segunda parte que o filme ascende a um patamar superior, culminando nalgumas das cenas mais memoráveis da História do Cinema e que povoam, certamente, o nosso imaginário. A direcção de centenas de figurantes e a própria direcção de actores revela-se inequivocamente magistral: Charlton Heston como Moisés, Yul Brynner como Ramsés II ou Anne Baxter como Nefretiri são papéis deveras excepcionais.
Reprovável em toda a história só mesmo a egocêntrica contradição moral que é condenar a autoridade déspota e assassina do Faraó e, com a mesma facilidade, glorificar a fé em Deus, ele próprio uma entidade monstruosa e autoritária, que dizima inocentes sem qualquer dó ou piedade. Mas enfim, contradições bíblicas às quais o filme não conseguiu fugir.
Independetemente desse aspecto, fica a memória de um épico não só grandioso como megalómano, naquele que foi um dos momentos altos do cinema de Hollywood.