★★★★★
Título Original: Minority ReportRealização: Steven Spielberg
Principais Actores: Tom Cruise, Samantha Morton, Colin Farrell, Max Von Sydow, Lois Smith, Steve Harris, Peter Stormare, Neal McDonough, Tim Blake Nelson, Joel Gretsch
Crítica:
A PROFECIA DO CRIME
In the land of the blind, the one-eyed man is king.
Mistura explosiva de acção, noir e ficção científica, Relatório Minoritário afirma-se como um sofisticado e por demais refinado pedaço de cinema, perturbante até às entranhas, capaz de projectar as mais pertinentes questões éticas e morais sobre a evolução do modelo social e tecnológico num futuro tão fantasioso quanto verosímil, onde a eterna luta pela sobrevivência continua a potenciar o progresso. Perfeccionista, visionário e, uma vez mais, reinventando-se a si próprio, Steven Spielberg conduz uma obra de entretenimento empolgante e inteligente, capaz de desafiar o espectador a cada compasso.
A atmosfera é sinistra e plena de suspense - a qual em muito se deve ao candor inebriante da fotografia e iluminação de Janusz Kaminski (tremendamente assombroso, o trabalho do técnico; notem-se os tons saturados e o grão, os feixes e as sombras, os enquadramentos non-stop), à esquizofrénica, distópica mas a espaços esperançosa banda sonora do mestre John Williams e à ambiciosa e prodigiosa estética conceptual e imagética, na qual assentou o incrível esplendor dos cenários de Alex McDowell. Em suma, o núcleo sólido das produções de Spielberg.
Washington, 2054. Entre arranha-céus de vanguarda e monumentos do passado, entre auto-estradas verticais e divisões transparentes - quão transparente é todo o universo idealizado, como que anunciando o fim da privacidade -, entre veículos revolucionários e murais publicitários que, por acção intermédia de scanners identificadores, se dirigem aos potenciais consumidores - há toda uma parafernália criativa que, num reflexo bem mais positivo do que o de Blade Runner, espelha a própria evolução do género. Tecnicamente irrepreensíveis, a propósito, os efeitos digitais e sonoros que, com uma aplicação não só notável como claramente eficaz, nos envolvem no complexo imaginário de presságios e sistemas perfeitos (?) de detecção de pré-crime, confluindo a dimensão sobrenatural com o delírio filosófico-científico. O futuro como certeza ou como possibilidade. A dúvida, sobre os outros e sobre nós próprios. Seremos nós capazes? Será que o faríamos? Que consequências traria a adivinhação do amanhã? Quais os perigos da total entrega a um sistema dito infalível? O entendimento e a não-aceitação da morte. O estudo do hipotético, do livre-arbítrio e do drama humano, onde o thriller policial mergulha no espectro trágico e devastador do infortúnio.
A aura angelical de Samantha Morton, oráculo essencial, precipita o ritmo electrizante da narrativa, a fuga e a perseguição sem-tréguas, de cortar a respiração e humurada à boa maneira americana: a personagem de Tom Cruise, John Anderton, chefe da unidade de Pré-Crime prestes a expandir-se a todo o território nacional, é confrontado com uma pré-acusação de homicídio. O predador torna-se, de um momento para o outro, a presa - a matriz é por demais conhecida - mas aqui é alvo de um tratamento verdadeiramente ímpar. Max von Sydow completa um trio de performances cristalinas. Colin Farrell desempenha, com uma competência assinalável, um primeiro vilão, numa intriga tão plena de personagens carismáticas como de aparências, onde nada é aquilo que parece. Às tantas, a imprevisível viagem conhece paragens profundamente intimistas, onde a dor de perder um filho e a invocação da sua memória, num holograma, perpetuam, mais do que nunca, o carácter universal da história de Scott Frank e Jon Cohen, a partir do conto de Philip K. Dick.
A atmosfera é sinistra e plena de suspense - a qual em muito se deve ao candor inebriante da fotografia e iluminação de Janusz Kaminski (tremendamente assombroso, o trabalho do técnico; notem-se os tons saturados e o grão, os feixes e as sombras, os enquadramentos non-stop), à esquizofrénica, distópica mas a espaços esperançosa banda sonora do mestre John Williams e à ambiciosa e prodigiosa estética conceptual e imagética, na qual assentou o incrível esplendor dos cenários de Alex McDowell. Em suma, o núcleo sólido das produções de Spielberg.
Washington, 2054. Entre arranha-céus de vanguarda e monumentos do passado, entre auto-estradas verticais e divisões transparentes - quão transparente é todo o universo idealizado, como que anunciando o fim da privacidade -, entre veículos revolucionários e murais publicitários que, por acção intermédia de scanners identificadores, se dirigem aos potenciais consumidores - há toda uma parafernália criativa que, num reflexo bem mais positivo do que o de Blade Runner, espelha a própria evolução do género. Tecnicamente irrepreensíveis, a propósito, os efeitos digitais e sonoros que, com uma aplicação não só notável como claramente eficaz, nos envolvem no complexo imaginário de presságios e sistemas perfeitos (?) de detecção de pré-crime, confluindo a dimensão sobrenatural com o delírio filosófico-científico. O futuro como certeza ou como possibilidade. A dúvida, sobre os outros e sobre nós próprios. Seremos nós capazes? Será que o faríamos? Que consequências traria a adivinhação do amanhã? Quais os perigos da total entrega a um sistema dito infalível? O entendimento e a não-aceitação da morte. O estudo do hipotético, do livre-arbítrio e do drama humano, onde o thriller policial mergulha no espectro trágico e devastador do infortúnio.
There hasn't been a murder in six years.
The system, it is perfect.
The system, it is perfect.
A aura angelical de Samantha Morton, oráculo essencial, precipita o ritmo electrizante da narrativa, a fuga e a perseguição sem-tréguas, de cortar a respiração e humurada à boa maneira americana: a personagem de Tom Cruise, John Anderton, chefe da unidade de Pré-Crime prestes a expandir-se a todo o território nacional, é confrontado com uma pré-acusação de homicídio. O predador torna-se, de um momento para o outro, a presa - a matriz é por demais conhecida - mas aqui é alvo de um tratamento verdadeiramente ímpar. Max von Sydow completa um trio de performances cristalinas. Colin Farrell desempenha, com uma competência assinalável, um primeiro vilão, numa intriga tão plena de personagens carismáticas como de aparências, onde nada é aquilo que parece. Às tantas, a imprevisível viagem conhece paragens profundamente intimistas, onde a dor de perder um filho e a invocação da sua memória, num holograma, perpetuam, mais do que nunca, o carácter universal da história de Scott Frank e Jon Cohen, a partir do conto de Philip K. Dick.
Sometimes, in order to see the light,
you have to risk the dark.
you have to risk the dark.